Entenda os Textos de Paulo – Parte 3
O Evangelho de Paulo era contra a Torá?
Este estudo pretende falar sobre o evangelho que o Rav Sha’ul (apóstolo Paulo) pregava, com base na sua epístola aos Gálatas. A maioria dos teólogos cristãos entendem que Sha’ul ensinou contra a Torá do Eterno, Santo Bendito seja ele. Mas será que ele realmente pregava e ensinava contra a Torá que HaShem havia dado ao seu povo?
Há alguns anos, eu e outro irmão, Anderson de Carvalho, que também está em teshuvá, escrevemos artigos sobre temas dessa epístola, e nesse estudo estarei utilizando partes deles, para que vocês possam ter uma compreensão sobre o assunto.
Vejam uma coisa, qualquer pessoa sensata, que lê as declarações feitas pelo apóstolo em Romanos 7:12 entenderá claramente que ele não ensinou contra a Torá, leia:
"De fato a lei é santa, e o mandamento é santo, justo e bom"
Para termos uma perfeita compreensão das cartas Paulo, principalmente usando o PaRDeS, que é a hermenêutica judaica, devemos nos lembrar que precisamos analisar três pontos:
- Primeiro - Com quem Paulo estava falando ou qual é o destinatário;
- Segundo - Qual era o motivo da carta ou qual era a situação vivida pelo destinatário; e
- Terceiro - Qual era o contexto histórico vivido pela congregação e pelo destinatário.
É importante lembrar também que o apóstolo Paulo usava alguns pronomes para identificar com quem ele está falando. Assim, quando ele usa os pronomes "nós, nosso ou nossos", está falando dele e dos judeus. E quando usa "você, vocês, vosso ou vossos", está falando dos ex-gentios que agora fazem parte do povo do Eterno.
Então vamos ao Primeiro Ponto – Com quem Paulo estava falando ou qual é o destinatário. Talvez você ache estranho começarmos por esse ponto, afinal o nome da carta já define o destinatário. Porém, quem realmente eram os gálatas? Eles eram judeus ou gentios?
Olhando para o texto da carta poderemos facilmente distinguir o destinatário real. Então vejamos o texto de Gl 1, na Bíblia Judaica Completa de David H. Stern.
“De: Sha’ul, um emissário – recebi meu comissionamento não de seres humanos nem por mediação humana, mas de Yeshua, o Messias, e de Deus Pai, que o ressuscitou dos mortos – e de todos os irmãos que estão comigo
Para: As comunidades messiânicas da Galácia:
Graça e shalom a vocês de D’us, nosso Pai, e do Senhor Yeshua, o Messias, que se entregou a si mesmo por nossos pecados, a fim de nos libertar do presente sistema mundial maligno, em obediência à vontade de D’us, nosso Pai. A ele seja a glória para todo o sempre. Amén.
Estou estarrecido com o fato de vocês terem trocado tão rapidamente, àquele que os chamou pela graça do Messias, por outras supostas “boas novas”, que não são boas novas de forma nenhuma! A realidade é que certas pessoas estão aborrecendo vocês e tentando perverter as genuínas boas novas do Messias. Mas ainda que um de nós – ou até mesmo um anjo do céu - anunciasse a vocês “boas novas” diferentes das que já lhes anunciamos, que seja amaldiçoado para sempre! Como dissemos antes, repetimos agora: se alguém lhes anunciar boas novas diferentes das que já receberam, seja amaldiçoado para sempre!” Gálatas 1:1-9
Repare que na introdução dessa carta, o apóstolo ou emissário, fala de seu chamado e que o Evangelho ou boas novas que anunciou era verdadeiro. E que algumas pessoas estavam trazendo um falso evangelho, vamos falar sobre isso mais à frente. Agora, repare de quem e para quem o apóstolo fala.
Primeiro ele diz que a carta era para as comunidades messiânicas da Galácia. E devemos ter o entendimento que não era uma igreja (prédio) na cidade, como muitos pensam, mas comunidades que se reuniam em vários lugares na cidade, de acordo com o que podemos ler em Rm 16. Eram famílias, irmãos e amigos que se reuniam em casas e que se revesavam nos ensinos e instruções da Torá, que o apóstolo havia lhes deixado. Agora repare também nos pronomes utilizados por ele. Note que no verso 3 ele diz: “Graça e shalom a vocês de D’us, nosso Pai, e do Senhor Yeshua, o Messias,…”, vejam que faz distinção de vocês e nosso. Isso é porque ele está desejando que a graça e a shalom (paz) fossem com esses crentes ex-gentios da Galácia, da parte de D’us que como ele disse, nosso Pai. O Eterno é o Pai do povo de Israel, de acordo com Ex 4:23:
“e eu já lhe disse que deixe o meu filho ir para prestar-me culto. Mas você não quis deixá-lo ir; por isso matarei o seu primeiro filho!”
Também podemos ver que ele fala do povo de Israel quando diz: “...se entregou a si mesmo por nossos pecados, a fim de nos libertar do presente sistema mundial maligno, em obediência à vontade de D’us, nosso Pai…” Pois aqueles que estão vivendo sob ou debaixo da lei são o povo do Eterno, e como pecado é transgressão da Lei, só pode transgredir quem vive sob a Lei, tentando acertar. Os gentios que não tinham D’us, não tinham a Torá, e nem a promessa do messias, não viviam sob a Lei. Eles são iníquos ou anomos, sem Lei. Por isso podemos entender que Paulo se refere a si e a seu povo.
Mas repare que o destino e objetivo da carta é esse: “A realidade é que certas pessoas estão aborrecendo vocês…” Algumas pessoas estavam vindo a estes ex-gentios, com um ensinamento diferente do que eles tinham aprendido com o apóstolo. Veja, aborrecendo vocês, o pronome mostra. O ensino que estava chegando e aborrecendo, era repleto de legalismos e distantes da verdadeira Torá ensinada por Paulo. Por isso ele chama esses ensinos de falso evangelho ou boas novas que não são boas novas. E quando continuamos a ler os versos seguintes desse primeiro capítulo temos certeza que Paulo está falando a ex-gentios, e que seu evangelho é destinado a gentios ou remanescentes israelitas espalhados entre as nações.
Entendemos então o primeiro ponto, que era a quem a carta é destinada, e também entendemos o segundo ponto, que é: qual era o motivo da carta ou qual era a situação vivida pelo destinatário. Quando dissemos que Paulo estava combatendo um falso ensino que estava adentrando as comunidades naquela cidade.
Entendendo o que é então evangelho.
Muitos levam em conta que evangelho é apenas boas novas a respeito de Yeshua, ou seja, dizer o que Yeshua fez. Falar de seus milagres, de sua morte e ressurreição. Mas isso não é evangelho! Na verdade, Evangelho é outra coisa.
“Você, que traz boas novas (evangelho) a Sião, suba num alto monte. Você, que traz boas novas (evangelho) a Jerusalém, erga a sua voz com fortes gritos, erga-a, não tenha medo; diga às cidades de Judá: "Aqui está o seu Deus! "” Isaías 40:9
“Desde o princípio eu disse a Sião: "Veja, estas coisas acontecendo! " A Jerusalém eu darei um mensageiro de boas novas(evangelho).” Isaías 41:27
“Como são belos nos montes os pés daqueles que anunciam boas novas (evangelho), que proclamam a paz, que trazem boas notícias, que proclamam salvação, que dizem a Sião: "O seu Deus reina!"” Isaías 52:7
Com esses versos podemos perceber que o termo boa novas refere-se à Torá, que é levada por um mensageiro do Eterno. Veja nesse último verso, quando o profeta fala “Como são belos nos montes os pés daqueles que anunciam boas novas (evangelho), que proclamam a paz, que trazem boas notícias, que proclamam salvação, que dizem a Sião: “O seu D’us reina!” Esse verso fala de anunciar boas novas, proclamam a paz, proclamam salvação e dizem que D’us reina. E todas essas são características da Torá. Então, podemos entender que Evangelho é a instrução do Eterno, a Torá.
O que quero mostrar até aqui, é que o evangelho que Paulo pregava era o ensino da Torá, a respeito do Messias, e de seus ensinos, que também eram sobre a Torá. Na verdade, Yeshua representava a própria Torá, pela forma como ele vivia em obediência ao Eterno. E o Apóstolo Paulo sabia muito bem disso, pois seu ensino, ou evangelho, ou boas novas eram verdadeiros, porque representavam a verdade do Eterno.
E por isso, podemos então observar e entender através das declarações de Paulo, de que a Torá é santa, e o seu mandamento é santo, justo e bom, que ele ensinava a Torá e não contra ela. Assim, fica clara a indignação do apóstolo quanto ao fato de os Gálatas terem dado ouvidos a ensinos errados depois de conhecerem a verdade. Podemos ver isso no Capítulo 3:1. "Ó gálatas insensatos! Quem os enfeitiçou? Não foi diante dos seus olhos que Yeshua Hamashiach foi exposto como crucificado?”
A Lei de D’us pode tornar alguém insensato?
Ou a má interpretação e aplicação da Torá do Eterno é que podem tornar alguém insensato?
São questões que a maioria dos teólogos não fazem, diante de inúmeras declarações e evidências bíblicas a respeito da Lei de D’us, conforme já mencionei antes. Agora, conforme já disse no início desse estudo, algo estava prejudicando a fé daqueles ex-gentios crentes recém saídos do paganismo. Havia grupos de judeus religiosos legalistas daquela região da Galácia, que ao presenciarem ex-gentios servindo ao D’us de Avraham (Abraão), Yt’zchack (Isaque) e Ya’akov (Jacó), junto com os judeus seguidores de Yeshua, decidem se aproximar desses irmãos. Esses religiosos acreditavam que por meio da guarda legalista das Leis de D’us, eles poderiam se declarar justos, e estavam ensinando isso aos Gálatas.
Esta guarda legalista da Lei de D’us incluía as chamadas “obras de Lei” (ma’assei hatorah), ou “leis de cerca”, criadas com o propósito de “proteger” aos adeptos de transgredirem a Lei de D’us, com base em hábitos/costumes legalistas de seus líderes. Isso fazia com que estes religiosos estabelecessem sua justiça própria, independente da justiça de HaShem. E com isso, eles não criam na justiça de D’us manifestada pelo messias, a justiça concedida a todo que crê e obedece.
Aqueles religiosos viram uma oportunidade de convencer aos Gálatas sobre a “justiça por meio da observância legalista da Torá”. Eles se aproximaram desses ex-gentios aproveitando-se do fato de estarem servindo ao Eterno, assim como também hoje acontece, pessoas que não crêem verdadeiramente na vida justa de Yeshua, tentam enganar os que estão se aproximando do povo do Eterno.
Notem os seguintes versos:
“Gostaria de saber apenas uma coisa: foi pela prática legalista da lei que vocês receberam o Espírito, ou pela fé naquilo que ouviram? Será que vocês são tão insensatos que, tendo começado pelo Espírito, querem agora se aperfeiçoar pelo esforço próprio? Será que foi inútil sofrerem tantas coisas? Se é que foi inútil! Aquele que lhes dá o seu Espírito e opera milagres entre vocês, realiza essas coisas pela prática legalista da lei ou pela fé com a qual receberam a palavra?” Gálatas 3:2-5
Perceba que o apóstolo quer mostrar que quem se convence ou é convencido desta “justiça” legalista, nega as promessas de D’us, nega a Graça de D’us, nega a justiça de D’us por meio do Messias Yeshua, e nega a sua condição de “sujeição ao pecado”, reconhecendo que tem em si uma Yetser Hará (inclinação para o mal). Por isso, Rav Sha’ul expõe um ensino sobre a Lei de D’us, em relação ao legalismo daqueles religiosos, que tornaram aos Gálatas insensatos. Ele ensinou sobre o fato da Lei de D’us jamais anular a promessa feita a Avraham, assim como a Emunah (fé, confiança, fidelidade), não se apoia no legalismo.
Paulo também ensinou que a justiça que provém da prática legalista de Lei de D'us é ineficaz para quem deseja ser justificado por meio dela, por causa do PECADO, que é a transgressão da Lei (1 João 3:4);
“Todo aquele que pratica o pecado transgride a Lei; de fato, o pecado é a transgressão da Lei.”
Ensinou também que a Lei de D'us serviu como um "tutor" (aio, guardião, guia, protetor) do povo judeu, até quando viesse Aquele que cumpriria de forma PLENA a promessa dada a Avraham: Yeshua. Pela Emunah Nele (fé,confiança, fidelidade), o povo de D’us pode agora viver a plenitude da Lei do Eterno, pois a mesma cumpriria o propósito da Nova Aliança, descrita em Jeremias 31:31-35.
Sha'ul comparou esta religiosidade legalista a uma "escravidão", a qual a Jerusalém da época estava sujeita. E mais, ele declarou que, aquele que busca se justificar pela guarda legalista da Lei de D'us, está sob maldição:
"Já os que são pela prática legalista da lei estão debaixo de maldição, pois está escrito: 'Maldito todo aquele que não persiste em praticar todas as coisas escritas no livro da Lei'" Gl 3:10.
Entenda, a própria Torá prescreve as maldições para os desobedientes, para os pecadores ou transgressores. Como alguém poderia se justificar pela observância legalista da Lei de D’us, se a mesma declara “maldito” quem a transgride? Quem vive transgredindo a Lei de D’us jamais alcança uma justificação pela observância legalista, e quem busca se justificar pela observância legalista sem se atentar para suas transgressões, permanece debaixo de maldição.
Observe que jamais alguém pode ser justificado diante do Eterno nestes termos, e quem não é justificado permanece “réu” (culpado) diante de D’us, sob maldição. Yeshua é a justiça de D’us em favor do homem, que por causa do pecado (transgressão da Lei de D’us), jamais pode se declarar “justo” diante de D’us através da guarda legalista da Lei. O apóstolo cita o exemplo de Avraham, que não confiou em sua própria obediência ao Eterno, mas confiou nas promessas de D’us, e obedeceu ao Eterno por meio dessa confiança, demonstrada por suas obras (Tg 2:14-26), que foram confirmadas pelo próprio Eterno (Bereshit/Gênesis 26:5).
Para finalizar, pense no seguinte, a Lei de D’us se baseia na justiça de D’us, em sua retidão. Quem obedece a D’us, pratica a Lei de D’us, ou seja pratica a sua justiça, e não é de forma legalista. E quem pratica a justiça pode ser declarado justo por causa da prática da justiça. Essa pessoa não é justificada pela guarda legalista, mas sim é declarada justa por praticar a justiça, à partir da confiança na vida justa de Yeshua o messias.
Com isso, podemos ver que o entendimento errado das traduções das cartas de Paulo e das más interpretações, distantes do contexto original, levaram ao entendimento enganoso de que o apóstolo estava ensinando contra a Torá ou Lei de D’us. Porém, na verdade ele estava ensinando a Torá, de acordo com a Torá. Seu evangelho era a verdade da Torá. E os Gálatas estavam se distanciando por causa de ensinos errados de legalistas que queriam que eles buscassem justificação por observância legalista da Torá, totalmente desprovidos de confiança e entendimento da verdade, que é a Torá verdadeira.
Que o Eterno nos abençoe!
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