Estudos da Torá
Parashá nº 19 – Terumá (Oferenda, Oferta ou Coleta)
Shemôt/Êxodo Ex. 25:1-27:19
Haftará (Separação) 1Rs 5:12-6:13 e
B’rit Hadashah (Nova Ali ança) Mc 3:1-4:41; Mt 5.33-37
Tema: O significado de chifre
RELEMBRANDO
No nosso estudo da semana passada vimos que Yeshua não mudou a Torá, e nem anulou nenhum mandamento do Eterno e confirmamos que o que dizem são apenas más interpretações. Essa semana falaremos sobre o significado de chifre nas Escrituras.
A PARASHÁ DA SEMANA
Vamos ao resumo da parashá dessa semana, segundo podemos ver no site Chabad. A parashá Terumá inicia uma série de quatro das cinco porções que discutem em detalhes a construção do mishkan, o Tabernáculo móvel que servia de "local de repouso" para a presença de D'us entre o povo judeu.
A porção completa da semana relata a descrição de D'us a Moshê sobre como construir o mishkan, começando com uma lista dos vários materiais preciosos a serem coletados pelo povo judeu para este projeto monumental.
D'us descreve a magnífica Arca de madeira e ouro que abrigaria as tábuas com os Dez Mandamentos, completa com sua cobertura deslumbrante representando dois querubins (anjos com rosto de crianças) um de frente para o outro. Em seguida, D'us entrega a Moshê as plantas do Shulchan (mesa sagrada) sobre a qual os Lechem Hapanim (Pães da Proposição) serão colocados a cada semana.
Seguindo-se à descrição da Menorá de ouro puro que deveria ser feita de um único pedaço grande de ouro, D'us descreve a estrutura do próprio mishkan, detalhando a cobertura esplendidamente tecida e bordada, as cortinas, as divisões e as paredes externas móveis. A Porção da Torá conclui com as instruções para o altar de cobre e o grande pátio externo do mishkan.
Essa porção recebe o nome da atitude que o Eterno mandou que os filhos de Israel tomassem, eles deveriam fazer T’rumá (Oferenda, Oferta ou Coleta). O termo “Terumá ou T’rumá” guarda o significado de oferta, coleta ou contribuição. Ela vem da raíz “rûm” que significa altura, altivez, alto ou para cima.
Estudo do Texto da Parashá
"Faça um altar de madeira de acácia. Será quadrado, com dois metros e vinte e cinco centímetros de largura e um metro e trinta e cinco centímetros de altura. Faça chifres em cada um dos quatro cantos, formando uma só peça com o altar, que será revestido de bronze.” Êxodo 27:1,2
No texto da parashá dessa semana há algo intrigante e que muitas pessoas não entendem o significado, e como sempre acabam interpretando errado. Nesses versos que vimos acima o Eterno manda fazer chifres nos cantos do altar, de forma que ele formassem uma só peça. E talvez você se pergunte o que isso teria a ver com você? Ou talvez ainda poderia se perguntar porque precisa saber o significado de chifre? Afinal você já sabe que chifre é algo ruim, pois você aprendeu isso dentro do sistema religioso.
Pode até parecer estranho tratarmos sobre esse assunto, mas considero importante conhecer o que as Escrituras e os Escritos Nazarenos querem dizer quando trazem em seus contextos a palavra chifre, assim poderemos compreender o problema criado pelas religiões.
As religiões colocaram na figura de satan chifres, e os chifres são vistos como símbolos malignos ou pagãos, visto que se você fizer uma pesquisa encontrará imagens de deuses pagãos antigos com chifres. Podemos perceber também um grande antissemitismo nessa figura do diabo e do mal em si, criado pelo cristianismo e por seus adeptos, e espalhados principalmente através de literaturas. Mas por que atribuir chifres em satan e nos deuses antigos? Antes de responder de maneira irresponsável e sem compreender corretamente, procuremos entender melhor o que o TaNaK fala a respeito dos chifres.
O hebraico traz a palavra קֶ֤רֶן – qeren, que significa literalmente chifre, mas que infelizmente, poucas traduções para o português trazem como chifre, a maioria fala de pontas. Vejamos um exemplo dessa palavra traduzida de forma correta:
"E Tzadhoq, o sacerdote, tomou o chifre(קֶ֤רֶן - qeren) de azeite do tabernáculo, e ungiu a Shelomoh; e tocaram a trombeta, e todo o povo disse: Viva o rei Shelomoh!" 1 Reis 1.39
Antes de prosseguirmos com a análise nos texto das Escrituras vejamos algumas informações importantes, a fim de ampliar nosso entendimento.
Uma nota histórica e cultural da Bíblia Arqueológica a respeito dos chifres do altar diz que, os dois mais importantes altares rituais da vida religiosa de Yisrael eram o altar do holocausto, que era feito de bronze, e o altar do incenso, feito de ouro. E uma das características distintivas do desenho desses altares era as quatro pontas em forma de chifres, que se projetavam de cada um dos quatro cantos e que deveriam compor uma peça só com o altar, em vez de serem peças ligadas de forma independente (Ex 27:2 e 30:2). Segundo a citada nota a função exata desses chifres ainda é incerta. Ainda segundo o dicionário Wycliffe, o altar representava a justiça, pegar nos chifres ou pontas do altar era sinal de que alguém reivindicava refúgio de seu inimigo até que seu caso fosse propriamente julgado.
Retornando ao contexto do TaNaK, os chifres são símbolo de força e poder, devido à sua rigidez e ser naturalmente uma arma para atacar e defender. Esta ideia de rigidez podemos encontrar em Tehilim.
Disse eu aos loucos: Não enlouqueçais, e aos ímpios: Não levanteis a fronte (קָֽרֶן - qaren); Não levanteis a vossa fronte (קַרְנְכֶ֑ם – qarnekhem) altiva, nem faleis com cerviz dura. Tehilim/Salmos 75.4-5
Literalmente, nesse verso temos “não levanteis vosso chifre”, mas a tradução de JFA preferiu traduzir como “fronte”. Segundo o site Yeshua Melekh diz que, aqui vemos claramente o chifre associado à ideia de rigidez em sentido pejorativo, mas a ideia de rigidez vem do observar o mundo animal, como por exemplo, o touro que é um animal robusto e destemido, com grandes chifres e bastante força.
Ele tem a glória do primogênito do seu touro, e os seus chifres(וְקַרְנֵ֤י - veqarnê) são chifres (קַרְנָ֔יו – qarnav) de boi selvagem; com eles rechaçará todos os povos até às extremidades da terra; estes pois são os dez milhares de Efrayim, e estes são os milhares de Menasheh. Deuteronômio 33.17
Precisamos compreender que o touro era um animal bastante forte, e na antiguidade as pessoas usavam de elementos físicos para representar características abstratas. Percebemos isso quando observamos o alfabeto hebraico pictográfico, que mostra o significado de cada letra através de coisas reais observáveis do ambiente. Veja a imagem abaixo:
Note que ainda hoje fazemos muito isso, mas os povos de antigamente o faziam muito mais. Segundo o mencionado site, além do mais, eles tinham muito contato com a natureza, contato este, que hoje muitos de nós perdemos e e por isso desconhecemos tais aspectos. Logo, os antigos ao ver um animal tão forte como o touro, facilmente este animal se tornaria um símbolo para representar força e poder, porém, seus chifres são como coroas na cabeça do touro, logo, os chifres se tornaram este símbolo. Um símbolo de força e poder como já mencionamos.
Vejamos em tehilim/salmos outro exemplo de como o chifre representa força.
Ali farei brotar a força (קֶ֣רֶן - qeren) de David; preparei uma lâmpada para o meu ungido. Salmos 132.17
E também em Shemu’el vemos uma representação de poder.
Os que contendem com o Eterno serão quebrantados, desde os céus trovejará sobre eles; o Eterno julgará as extremidades da terra; e dará força ao seu rei, e exaltará o poder (קֶ֥רֶן - qeren) do seu ungido. 1 Samuel 2.10
De acordo com o que vimos nos dois versículos acima, o chifre é uma representação de força e poder, conforme já havia falado e aqui confirmado. Porém muitas pessoas estão acostumadas a ver nos chifres uma representação de coisas malignas, o que está muito distante de ser uma realidade dentro das Escrituras.
De fato, até podemos ter o chifre associado a algo mal, como por exemplo na profecia de Daniyel, onde temos uma fera bastante poderosa e que leva em sua fronte chifres.
E de um deles saiu um chifre (קֶֽרֶן - qeren) muito pequeno, o qual cresceu muito para o sul, e para o oriente, e para a terra formosa. Daniel 8.9
Esta fera no verso acima, representa um grande reino, e os chifres representam os reis que sobre ela governaram. Os chifres apenas evocam a ideia de poder e força, mas não visam representar símbolos malignos, trevas, etc, como geralmente se vê nos ensinos do sistema religioso
De acordo com o que já vimos, os chifres são símbolos representando coisas boas. Já vimos o chifre associado à David e veremos abaixo como o próprio Eterno instrui Mosheh para que seja feito chifres no altar do tabernáculo, como está no texto de nossa parashá.
E farás as suas pontas (קַרְנֹתָ֗יו – qarnotav) nos seus quatro cantos; as suas pontas (קַרְנֹתָ֗יו – qarnotav) serão do mesmo, e o cobrirás de cobre." Shemoth/Êxodo 27.2
Abaixo vamos ver a tradução que podemos encontrar na Bíblia de Jerusalém.
Faça uma ponta em forma de chifre (קַרְנֹתָ֗יו – qarnotav) em cada um dos quatro cantos, formando uma só peça com o altar, que será revestido de bronze." Êxodo 27.2 (Bíblia de Jerusalém – Paulus 2002)
Algumas pessoas podem achar estranho ao ler um texto no original e ver a palavra chifres associadas ao altar de sacrifícios a HaShem, pois associam a algo demoníaco. Porém, estes chifres no altar apontam para uma santidade, para a autoridade do Eterno, conforme vemos no verso abaixo.
Porém Adoniahu temeu a Shelomoh; e levantou-se, e foi, e apegou-se aos chifres (בְּקַרְנ֥וֹת – beqarnoth) do altar. 1Reis 1:50
No exemplo do verso acima, podemos perceber Adoniahu se salvando porque ele se agarrou nos chifres, logo, o aspecto de santidade que havia nestes chifres junto ao altar era muito grande, ao ponto de livrar a vida de uma pessoa.
O autor do estudo no site Yeshua Melekh faz o seguinte comentário: “Agora imagina só você chegar para uma pessoa e dizer que “o chifre salva”. Ou ela vai achar que é uma brincadeira, pois pra ela chifre indica traição, ou ela vai achar que você é satanista.”
Observe que acima, eu mencionei sobre os chifres de David, veja:
Ali farei brotar a força (קֶ֣רֶן - qeren) de David; preparei uma lâmpada para o meu ungido. Salmos 132.17
Aqui neste verso, David é um apontamento profético para o Messias prometido, Yeshua. Os chifres estão apontando para a autoridade que o Mashiach receberia do Eterno devido a sua vida de justiça, ou seja, obediência.
Mas veja que nos Escritos Nazarenos também trazem essa idéia de chifres apontando para força, poder e autoridade. O livro de Apocalipse possui muitas dessas referências, e todas elas apontam para as questões mencionadas. Vejamos alguns exemplos:
Então vi um Cordeiro, que parecia ter estado morto, de pé, no centro do trono, cercado pelos quatro seres viventes e pelos anciãos. Ele tinha sete chifres e sete olhos, que são os sete espíritos de Deus enviados a toda a terra. Apocalipse 5:6
Os sete chifres nesse verso é um apontamento para a autoridade que o cordeiro, que é um apontamento para Yeshua, recebeu para que sua justiça exercesse poder durante os sete milênios junto aos servos fiéis do Eterno.
Então apareceu no céu outro sinal: um enorme dragão vermelho com sete cabeças e dez chifres, tendo sobre as cabeças sete coroas. Apocalipse 12:3
No verso acima os dez chifres também apontam para pessoas com autoridade, mas aqui são referentes aos que farão parte dos que perseguirão os santos na tribulação. E do mesmo modo temos em Ap 13:1; 13:11; 17:3,7, 12 e 16.
Concluindo, nesse estudo vimos que chifre, que no hebraico é qeren, nunca foi tido na época em que as Escrituras foram sendo escritos, como um símbolo ruim, muito pelo contrário, era um símbolo de força, poder e autoridade. Vimos também que os chifres estavam no altar do mishkan e no templo. E na antiguidade, os povos criavam os seus deuses e lhes atribuíam força e poder através de chifres para adorá-los. Dessa forma, fica claro para nós o motivo pelo qual as religiões colocaram chifres em satan e nos demônios. Basta uma rápida pesquisa na internet para ver como essa figura com chifres, rabo de seta e tridentes foi sendo criado com o passar dos séculos pelas religiões. O propósito era e ainda é causar medo e prender as pessoas ali, assim como para alguns é adorar a uma criatura em detrimento do criador.
Assim, podemos perceber que não há contextos nas Escrituras que não possam ser explicados corretamente de acordo com a cultura do povo ao qual as Escrituras foram escritas.
Que possamos viver a cada dia aprendendo e esclarecendo os textos das Escrituras a fim de clarear entendimentos e trazer visão aos que estão cegos.
Que HaShem lhes abençoe!
Pr. Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)
Bibliografia:
- Torá – Lei de Moisés. Editora Sefer
- Dicionário Português-Hebraico e Hebraico-Português, Abraham Hartzamri e Shoshana More-Hartzamri, Editora Sêfer
- El Judaismo de Jesús. Mário Javier Saban. Editorial Saban, 2008
- https://www.yeshuamelekh.com.br/o_conceito_tanaico_de_chifre
- http://shemaysrael.com/parasha-teruma/
- https://pt.chabad.org/library/article_cdo/aid/771026/jewish/Resumo-da-Parash.htm
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