Estudos da Torá
Parashá nº 25 – Tsav (Ordena)
Vayicrá/Levítico Lv 6:1-8:36,
Haftará (Separação) Jr 7:21-8:3, e
B’rit Hadashah (Nova Aliança) Rm 12:1,2 1Co 10:14-23
Tema: A urgência em obedecer.
No estudo dessa semana falaremos sobre urgência de se obedecer aos mandamentos do Eterno.
RESUMO DA PARASHÁ DA SEMANA
A Parashá Tsav começa com D'us continuando a ensinar Moshê muitas das várias leis relativas ao serviço no Mishcan, Santuário. Entretanto, enquanto a Porção da semana passada descreveu os corbanot, sacrifícios, da perspectiva do doador, nesta semana a Torá concentra-se mais diretamente nos Cohanim, fornecendo mais detalhes sobre seu serviço.
Após descrever primeiro a manutenção do fogo que ardia sobre o altar, a Torá discute em detalhes os vários tipos de corbanot que Aharon, seus filhos e as gerações seguintes de Cohanim estariam oferecendo. As oferendas deveriam ser trazidas com as intenções apropriadas, e comidas em um estado de pureza espiritual.
Finalmente, Moshê realiza os prolongados melu'im, serviço de consagração do Mishkan , e Moshê unge e introduz Aharon e seus filhos para o serviço deles no Mishkan, em frente de toda a congregação de Israel.
ESTUDO DO CONTEXTO LITERAL, PRÁTICO E PROFÉTICO
Falou mais o Eterno a Moshê,dizendo: Ordena a Aharon e a seus filhos, dizendo: Esta é a lei do holocausto; o holocausto será queimado sobre o altar toda a noite até pela manhã, e o fogo do altar arderá nele. Lv 6:1 e 2
A palavra hebraica geralmente traduzida como “lei” é “toráh”, que significa “instrução”, “ensino” ou “doutrina”. Neste caso vemos que a palavra toráh também pode aparecer limitada a uma instrução específica acerca da oferta de ascensão, também chamada “holocausto”, (do latim “tudo queimado”). Nesta parte há instruções específicas para Aharon e seus filhos - os sacerdotes.
O site Emunah a fé dos Santos informa que as instruções que foram dadas na parashá anterior, sobre as diferentes ofertas são para o povo em geral, mas nesta parashá há instruções específicas e complementares para os sacerdotes relativamente aos mesmos sacrifícios que foram mencionados anteriormente. Daqui aprendemos também que quando vem a revelação divina às nossas vidas, não vem toda de uma vez. Primeiro é dada uma imagem geral, e logo o Eterno volta a dar mais detalhadamente as coisas que foram descritas de forma geral.
Segundo o site, a Torá foi escrita para se harmonizar com a mente humana, e a mente não trabalha de forma linear, mas sim de forma circular. Ou seja, não segue um esquema linear, mas sim circular/espiral. Avança num determinado tema para logo voltar a ele observando outros detalhes. Neste caso específico, já tinha sido dada uma visão geral no capítulo 1 de Levítico sobre a oferta de ascensão e agora este tema é destacado novamente nesta parashá para dar detalhes complementares sobre essa oferta. O mesmo sucede-se com as outras ofertas.
De acordo com Bruno Summa, em seu comentário dessa parashá, no livro Sha’arei Torah Vayikra 1, a maneira como as ofertas são apresentadas nessa parashá não apenas se distingue da forma como foram apresentadas anteriormente, como também se distingue da maneira como a Torah se dirije a Moshê e ao Povo de Yisrael. Ele ainda diz que, de forma geral, a Torah utiliza os verbos לדבר - LEDABER - “falar” e לאמור - LE’EMOR - “dizer” quando o Eterno diz algo a Moshê, ou תצוה - TETZAVEH – “ordenarás”, quando ordena algo a Moshê de forma mais concisa. Contudo, sobre como as ofertas deveriam ser feitas pelos sacerdotes, HaShem se dirige a Moshê dizendo צַו - TZAV, uma forma mais categórica de se dar uma ordem. O uso do Tzav implica algumas coisas que deveriam ser levadas em consideração por Moshê e Aharon e que diferencia o que será dito quando comparado às outras formas em que HaShem se comunica com Moshê.
Tzav implica três aspectos: urgência, imediatismo e gerações futuras. Rashi, Vayikra 6:2
O autor nos mostra que Rashi ao dizer Tzav a Moshê, o Eterno está lhe dizendo o que seria dito a seguir demanda urgência, deve ser feito imediatamente e é algo que será observado por todas as futuras gerações. Segundo o autor há tantos comentários rabínicos a respeito dessas palavras de Rashi sobre o termo Tzav que daria para escrever um livro a respeito do assunto. No entanto, essa “urgência” serve para que os sacerdotes dessem prioridade às ofertas que seriam levadas por Yisrael, que deveriam iniciar os trabalhos imediatamente e que deveriam observar essa lei por todas as gerações, algo difícil, dado que muitas das gerações futuras da Yisrael, como a que estamos no presente momento, não mais observam essas leis por conta da inexistência do templo. E apesar dessas explicações serem válidas, podemos interpretá-las por outro ponto de vista, o psicológico, tornando essas leis em leis eternas que podem e devem ser observadas por todos nós em nossos dias.
A urgência mencionada é a capacidade de perceber que a vontade de HaShem possui precedência absoluta sobre qualquer tipo de ação que desejamos fazer em nome do Eterno de forma voluntária e que HaShem não ordenou. Isso é um ato bom desde que não preceda os mandamentos da Torah.
Devemos ter em mente que não podemos nos levar pelo imediatismo. O mencionado autor afirma que a melhor forma de expressar esse erro se encontra no tempo das mitzvot. Um homem sabe que há um dia santo para HaShem na semana, mas ele não deseja observá-lo no Shabat, então ele troca o dia pelo domingo ou por qualquer outro dia da semana, ou talvez, deixa para depois algum mandamento que deve ser observado em um determinado momento estabelecido pela Torah. Os mandamentos da Torah não podem ser obedecidos conforme nossa disposição. O que o Eterno nos ordenou deve ser observado imediatamente no momento propício e jamais ajustado de acordo com nossas conveniências.
Lembre-se que estamos falando sobre a urgência em se obedecer aos mandamentos de HaShem e isso precisa ser passado para as gerações futuras. Baruch HaShem que estamos obedecendo isso, mas precisamos também fazer isso para com nossos filhos, familiares e amigos. Falar sobre os mandamentos do Eterno e ensinar todas as vezes que houver oportunidade, afinal quem toca é o próprio Eterno. Já que estamos falando sobre os mandamentos e em como eles devem ser observados, entendemos que o que é eterno às gerações futuras não trata dos mandamentos dados somente aos sacerdotes, mas sim aos que são para todos. Eles devem ser ensinados de pais para filhos, e esse é um mandamento com profundo mistérios proféticos por trás.
Com isso, é importante mencionar o perigo que as pessoas correm ao relativizar os mandamentos do Eterno dizendo que ele permitiu que sua vontade fosse deixada de lado, ou que seus mandamentos fossem abolidos. Isso ocorre por falta de entendimento dos ensinos da Torah e dos profetas. Eles duvidam da validade da Torah em nossos dias. E um dos pontos que mais lhes atrapalham ao pegar textos de forma isolada como base para seus entendimentos errados se encontram em dois versos.
- Shemot/Êxodo 34:7
נֹצֵ֥ר חֶ֨סֶד֙ לָאֲלָפִ֔ים נֹשֵׂ֥א עָוֹ֛ן וָפֶ֖שַׁע וְחַטָּאָ֑ה וְנַקֵּה֙ לֹ֣א יְנַקֶּ֔ה פֹּקֵ֣ד׀ עֲוֹ֣ן אָבֹ֗ות עַל־בָּנִים֙ וְעַל־בְּנֵ֣י בָנִ֔ים עַל־שִׁלֵּשִׁ֖ים וְעַל־רִבֵּעִֽים
Notser chesed laalafym nose avon vafesha vechataah venaqeh lo yenaqeh poqed avon avot al-banym veal-bney vanym al-shileshym veal-ribeym.
Crescente em bondade à mil gerações, perdoa transgressões, iniquidades e pecados, mas não isenta todas as punições, pois visita a iniquidade dos pais nos filhos, até a terceira e quarta gerações.
- Bamidbar/Números 14:18
יְהוָ֗ה אֶ֤רֶךְ אַפַּ֨יִם֙ וְרַב־חֶ֔סֶד נֹשֵׂ֥א עָוֹ֖ן וָפָ֑שַׁע וְנַקֵּה֙ לֹ֣א יְנַקֶּ֔ה פֹּקֵ֞ד עֲוֹ֤ן אָבוֹת֙ עַל־בָּנִ֔ים עַל־שִׁלֵּשִׁ֖ים וְעַל־רִבֵּעִֽים
O Eterno erekh apaym verav-chesed nose avon vafasha venaqeh lo yenaqeh poqed avon avot al-banym al-shileshym veal-ribeym.
O Eterno, tardio em se irar e crescente em bondade, perdoa os pecados e as iniquidades, mas não isenta todas as punições, pois visita a iniquidade dos pais sobre os filhos até a terceira e quarta gerações.
Bruno Summa diz que os dois textos falam que o Eterno visita a iniquidades dos pais nas gerações seguintes. Para alguns a dificuldade que há nesses versículos os tornou questionáveis porque, posteriormente, o TaNaK dá a entender através do profeta Jeremias que HaShem “mudou de idéia”.
Assim, naqueles dias não mais dirão: os pais comeram uvas verdes e os dentes dos filhos apodreceram. Ao contrário, cada um morrerá por causa do seu próprio erro e pecado. Jr 31:29 e 30
Sem dúvida alguma a impressão inicial é que HaShem não agirá mais da forma como Ele disse que agiria, gerando uma falsa ideia de mudança comportamental. Se uma mudança de ideia ocorre, o que garante que não haverá uma mudança total? Isso é, se HaShem aboliu uma forma de agir, por que não aboliria Ele toda a Torah? Em sua reflexão o autor faz esse questionamento já trazendo a resposta em seguida, acompanhe comigo.
Esse pensamento herege causado por uma extrema falta de entendimento da Torah dos profetas e do D’us de Yisrael, levou muitos a acreditarem na abolição da Torah e na mudança de D’us.
É preciso ter em mente duas coisas importantes, primeiro, HaShem não muda conforme Ml 3:6, e toda e qualquer interpretação dos livros dos profetas deve ser feitas com base na Torah, se a Torah diz X e aparentemente o profeta diz Y, é sinal que necessitamos estudar mais a Torah para podermos interpretá-la da mesma forma que o profeta. Nunca podemos assumir que o que eles dizem seja alguma forma de refutação da Lei de HaShem, que Ele não permita! Com isso esclarecido, vamos entender a ligação das iniquidades com as gerações.
Segundo o autor, tanto o texto de Ex 34:7 e Nm 14:18 tratam basicamente dos mesmos atributos de HaShem, tardio em irar, abundante em bondade, misericordioso e que visita os pecados dos pais nos filhos. Em ambos os versos, a palavra “visita” é a mesma poked - פֹּקֵ֞ד – palavra a qual também aparece em um vesículo posterior no próprio livro Números, mas dessa vez com um significado um pouco diferente de “visita”:
וַיֹּֽאמְרוּ֙ אֶל־מֹשֶׁ֔ה עֲבָדֶ֣יךָ נָֽשְׂא֗וּ אֶת־רֹ֛אשׁ אַנְשֵׁ֥י הַמִּלְחָמָ֖ה אֲשֶׁ֣ר בְּיָדֵ֑נוּ וְלֹא־נִפְקַ֥ד מִמֶּ֖נּוּ אִֽישׁ
Vayomeru el-mosheh avadeykha naseu et-rosh aneshey hamilechamah asher beyadenu velo-nifqad mimenu ysh.
Eles disseram a Mosheh, seus servos checaram os guerreiros sob nosso comando e nenhum foi diminuído (faltava).
Nesse verso, o autor mostra a palavra NIFKAD - נִפְקַ֥ד – da mesma raiz de POKED - פֹּקֵ֞ד, que nesse caso significa “absentista”, um tipo de ausência, uma diminuição nos ranks. Dessa forma é possível lê-lo da seguinte forma:
פֹּקֵ֞ד עֲוֹ֤ן אָבוֹת֙ עַל־בָּנִ֔ים עַל־שִׁלֵּשִׁ֖ים וְעַל־רִבֵּעִֽים
poqed avon avot al-banym al-shileshym veal-ribeym.
Mas diminui as iniquidades dos pais até a terceira e quarta gerações. Nm 14:18
HaShem é tardio em se irar, abundante em bondade, misericordioso e, se os pais colocarem seus filhos, netos e bisnetos em Seus caminhos, Ele não cobrará pelos seus pecados, apagará os erros individuais e todos os tipos de maldições hereditárias serão extintas. Sendo assim, vemos que a Torah não diz que HaShem punirá os filhos por causa dos pais, pelo contrário, ela diz que HaShem é tão bom que Ele não cobrará os pecados dos pais graças aos méritos dos filhos, isso é o contrário do que muitos interpretam erroneamente. E aí, percebemos mais uma vez a importância de se estudar as Escrituras no contexto original. Não faz sentido algum os filhos serem castigados pelos pecados dos pais, mesmo que a criança siga no mesmo caminho pecaminoso, seria apropriado apenas que ela sofresse por essa sua decisão e não por causa da decisão de seus pais. Aprendemos assim, que quando os pais, mesmo que tenham praticado pecados, colocam seus filhos nos caminhos de HaShem, os méritos que eles gerarão limparão as iniquidades dos pais, isso é maravilhoso!!!
Dessa forma, para finalizar nosso estudo, pensemos que de acordo com o mencionado autor, podemos interpretar a palavra Tzav como:
“Tudo que HaShem nos ordena (tzav) serve para que possamos resistir ao yetser harah e para que não sejamos acusados por satan, algo que apenas é possível quando observamos sua vontade conforme ele a estipulou e para que tenhamos méritos pelas gerações futuras ao ensiná-las os caminhos da Torah.”
Que possamos viver a prática da Torah conforme o Eterno nos ordena e não como nós desejamos ou estipulamos, e que venhamos ser exemplo para nossos filhos e amigos.
Que HaShem lhes abençoe!
Pr/Rav. Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)