Estudos da Torá
Parashá nº 3 – Lech Lechá (Vá por ti)
Bereshit/Gênesis 12.1-17.27
Haftará (separação) Is 40.27-41.16 e
B’rit Hadashah (nova aliança) Mt 5.1-48; At 7:1-8
Tema: A influência do ambiente na nossa vida
Sabemos que o Eterno chamou Avram desde Ur dos Caldeus, a fim de sair do meio de um ambiente de idolatria e de todo o sistema pecaminoso que havia naquela região, para ir em direção à uma terra que o próprio D’us lhe mostraria. Mas interessante é que, nesta nova terra, também havia idolatria e um sistema pecaminoso. Qual a diferença de ambiente então? Esta terra, a chamada terra de Kenaan seria dada ao patriarca e a seus descendentes como herança, à partir de uma aliança com o criador, e isso tinha e tem apontamentos proféticos importantes. E neste estudo vamos tratar um pouco a respeito do ambiente que circunda o servo de D’us e a influência desse ambiente em nossa vida.
A PARASHÁ DA SEMANA
Observamos na parashá passada que o Eterno viu a vida reta que Nôach escolheu viver, em obediência à vontade divina. Também falamos sobre as leis de Nôach e sua verdadeira compreensão que deve ser tirada de toda a Escritura.
Agora, entraremos na terceira parashá, onde iniciaremos o estudo sobre a vida de Avraham, nosso pai na emunáh (fé, confiança, firmeza), que na época ainda era chamado de Avram. Essa parashá é considerada uma das porções mais importantes da Torá, pois ela trata do chamado de Avram(Abrão), o primeiro patriarca da nação de Yisrael. E nela temos a oportunidade de aprender muitas coisas a respeito da promessa que o Eterno fez a este patriarca e de sua repercussão para as nações do mundo, através de seus descendentes, e principalmente de Yeshua HaMashiach, que iniciou a concretização dessas promessas.
Assim, para uma visão mais ampla da parashá, antes do estudo do tema, vamos ao resumo da porção, com base no resumo do site Chabad. O Eterno fala a Avram, ordenando: “Sai da tua terra, do teu local de nascimento e da casa de teu pai, para a terra que Eu te mostrarei.” Ali, D'us diz, ele será transformado numa grande nação. Avram e sua esposa, Sarai, acompanhados pelo seu sobrinho Lot, viajam para a terra de Kenaan, onde Avram constrói um altar e continua a divulgar a mensagem de um único D'us.
Uma fome regional força o patriarca a partir para o Egito, onde a linda Sarai é levada ao palácio do faraó; Avram escapa da morte porque eles se apresentam como irmão e irmã. Uma praga impede o rei egípcio de tocá-la, e o convence a devolvê-la a Avram e a compensar o irmão – revelado como marido – com ouro, prata e rebanho.
De volta à terra de Kenaan, Lot se separa de Avram e se instala na perversa cidade de Sodoma, onde se torna cativo dos poderosos exércitos de Kedorlaomer e seus três aliados conquistam as cinco cidades do Vale de Sodoma. Avram vai com um pequeno grupo para resgatar seu sobrinho, derrota os quatro reis, e é abençoado por Malki-Tsedek, o rei de Shalem (cidade que muito tempo depois será chamada de Yerushalém).
O Eterno D'us sela o Pacto entre as Partes com Avram, no qual o exílio e a perseguição (galut) do povo de Israel é profetizada, e a Terra Santa é entregue a eles como seu eterno legado. Ainda sem filhos dez anos após sua chegada na Terra, Sarai diz a Avram para dormir com sua criada Hagar. Esta concebe, torna-se insolente com sua patroa, e então foge quando Sara a trata duramente; um anjo a convence a retornar, e diz a ela que seu filho será pai de uma populosa nação. Yishmael nasce quando Avram tem oitenta e seis anos.
Trinta anos depois, D'us muda o nome de Avram para Avraham (“pai das multidões”) e Sarai para Sara (“princesa”), e promete que um filho nascerá para eles; deste filho, que eles deveriam chamar de Yitschac (“vai rir”), nascerá uma grande nação com a qual D'us estabelecerá Seu vínculo especial. Avraham é ordenado a circuncidar a si mesmo e a seus descendentes como um “sinal do pacto entre Eu e você”, segundo o Eterno. Avraham obedece imediatamente, circuncidando a si mesmo e a todos os homens de sua família.
ESTUDO DO TEXTO DA PARASHÁ
Enquanto viveu em Ur, Avram não se misturava com a idolatria daquele lugar, os rabinos através de vários midrashim e de passagens da Torá Oral nos informam o comportamento do patriarca ali. Claro que ele não era perfeito, mas o Eterno viu sua intenção em não se misturar com aquelas coisas, não se contaminar com o ambiente ao seu redor, mesmo que ainda não conhecesse o D’us Altíssimo, pois ainda não o havia chamado. Entretanto, quando foi chamado, logo atendeu e partiu na direção indicada pelo Eterno. E nessa parashá, a Torah escrita nos relata o início dessa caminhada do patriarca com o Eterno em meio a ambientes diferenciados, e nem sempre propícios a ele. Vejamos o texto:
Partiu Avram, como lhe ordenara o Eterno, e Lót foi com ele. Avram tinha setenta e cinco anos quando saiu de Harã. Levou sua mulher Sarai, seu sobrinho Lót, todos os bens que haviam acumulado e os seus servos, comprados em Harã; partiram para a terra de Kenaan e lá chegaram. Avram atravessou a terra até o lugar do Carvalho de Manre, em Shiquém. Naquela época os cananeus habitavam essa terra. Gênesis 12:4-6
O Eterno havia dado uma ordem ao chamar Avram. Ele deveria sair da terra e da parentela, ou seja, abandonar o país de nascimento e deixar os parentes. Mas ainda assim, vemos que ele era um bom homem, e não poderia abandonar seu sobrinho, ao qual se sentia responsável. Isso muitas vezes pode ser um problema ao seguir o caminho em que o Eterno nos coloca, ou seja, desejar ser mais amoroso do que o Eterno. Ao levar consigo seu sobrinho Lót, o patriarca levava consigo ainda o ambiente de sua terra natal, para um ambiente em que ele não sabia como iria encontrar.
Quando falamos de ambiente devemos levar em consideração alguns aspectos importantes. O primeiro deles é o ambiente que ele deixou para trás, depois o que ele ainda carrega consigo, ou seja, seus próprios erros, vícios, medos, problemas, e seu parente que o acompanhava. E também o ambiente do lugar em que ele estará conhecendo. Cada um desses ambientes podem exercer influência sobre sua vida e sua caminhada. E isso ocorre conosco também, por isso o estudo da Torah e sua prática é importante, a fim de manter um ambiente propício à sabedoria divina.
Nesse aspecto do assunto que estamos tratando, o rabino Isaac Dichi, autor de “Nos caminhos da Eternidade I”, segunda edição, ao comentar sobre a parashá Lech Lechá, discorre sobre a importância do meio ambiente, e começa dizendo o seguinte, observe a transcrição abaixo:
“Vashem berach et Avraham bacol” (Bereshit 24:1) – “E D’us abençoou Avraham em tudo.”
O Midrash Rabá (57:1) diz que esta bênção se refere ao fato de Hashem não ter voltado a testá-lo. Como se sabe, Avraham foi testado pelo Todo-Poderoso dez vezes e saiu-se bem em todos os testes que lhe foram impostos, principalmente no último, que foi levar seu filho Yitschac à akedá (sacrifício), depois de tantos anos de ansiedade por ter um filho.
É evidente, que se Avraham fosse testado novamente pelo Criador, iria sair-se da melhor forma, pois sua crença, fé e dedicação ao Todo-Poderoso não tinham limites ou barreiras.
Não obstante, vemos que pelo ponto de vista de nossos sábios, o fato de Avraham não ser novamente submetido à prova, foi considerado uma berachá – uma bênção.
Por outro lado, nesta parashá vemos que Lot, o sobrinho e cunhado de Avraham, estava disposto a abandonar a companhia de Avraham e unir-se às pessoas de Sedom, as quais a Torá denomina de “raim vechataim Lashem meod” (Bereshit 13:13) – más e pecadoras a D’us em demasia.
Em que situação colocou-se Lot? A quem uniu-se e quais difíceis testes teve de enfrentar, a ponto de nossos sábios associarem a ele o seguinte versículo (Mishlê 13:20): “Holech et chachamim yechcam veroê kessilim yeroa” – Aquele que acompanha os sábios acrescenta sabedoria e aquele que lidera os tolos passa a fazer o mal com eles?
Enquanto Lot estava em companhia de Avraham, estava na situação de “Holech et chachamim yechcam” e no momento que dispensou esta companhia, passou de uma situação nobre e honrada para a situação vexatória e baixa de “roê kessilim yerôa”. Daqui inferimos, o quanto o meio ambiente em que o indivíduo vive é importante, para que ele se mantenha em situação espiritual estável, com possibilidades de ascensão.
O simples fato de colocar-se em teste, já é considerado uma decadência, principalmente quando os motivos são materiais e os interesses, pessoais – que muitas vezes cegam o indivíduo. Ambições materiais levaram Lot a se separar de Avraham, pois percebeu que o Jordão era rico em água para poder abastecer seu rebanho.
Ao afastar-se dos sábios da Torá, a propensão do ser humano é afastar-se também do Criador e de seus mandamentos.
Tende a conformar-se e a convencer-se de que sua situação espiritual não é tão ruim, porque as pessoas que o rodeiam são piores do que ele. Porém se estivesse em um ambiente de Torá, em companhia de sábios e estudiosos, estaria sempre atento quanto a seu nível espiritual e a sua elevação, carregando consigo o título de “Holech et chachamim yechcam” - Aquele que acompanha os sábios acrescenta sabedoria.
Esta parashá comprova que ao afastar-se dos sábios da Torá, o indivíduo afasta-se também de D’us, conforme diz a Torá: “Vayissá Lot mikedem” (Bereshit 13:11). A explicação deste passuc – Vayissá Lot Micadmonô shel olam – e afastou-se Lot do Antecessor do Universo. Rashi explica, que Lot manifestou-se assim: “Não me interessa Avraham, nem o seu D’us!” Ou seja: Lot afastaria-se de Avraham, um grande sábio, e conseqüentemente afastaria-se também de D’us.
Mesmo que o indivíduo planeje separar-se de um ambiente sadio apenas por algum tempo, o simples fato de desligar-se deste meio já é considerado uma decadência. Isso deixa no indivíduo uma nódoa negativa cuja recuperação torna-se difícil.
Para demonstrar a importância do meio em que vivemos, nossos sábios trazem no Pirkê Avot um acontecimento que se passou com Rabi Yossef ben Kismá.
Certa vez, Rabi Yossef ben Kismá encontrou um indivíduo no caminho que o saudou, dizendo-lhe shalom e lhe perguntando de que lugar era ele. Rabi Yossef ben Kismá respondeu que vinha de uma grande cidade de sábios e escrivãos. Esse indivíduo, então, convidou-o para morar em sua cidade, oferecendo-lhe muitas riquezas. Rabi Yossef ben Kismá respondeu-lhe, que mesmo que lhe fossem dadas todas as riquezas do mundo, somente moraria em lugares onde houvesse Torá, porque após o falecimento não são as pedras preciosas, o ouro e a prata que nos acompanham, mas somente a Torá e suas mitsvot. (Páginas 28 - 31)
O QUE ESTÁ AO REDOR
Conforme disse acima os diversos tipos de ambientes podem exercer influência sobre sua vida e sua caminhada. E repetindo o que já mencionei isso pode ocorrer conosco também, ou seja, nossas experiências anteriores ao caminho, as pessoas ao nosso redor e outras tantas coisas, por isso o estudo da Torah e sua prática é importante, a fim de manter um ambiente propício à sabedoria divina e as consequentes bênçãos da obediência.
Na psicologia há uma área de estudo chamada Psicologia Ambiental e ela afirma que o ambiente afeta o comportamento, assim como o comportamento afeta o ambiente. Essa é uma das principais proposições da psicologia ambiental, área que estuda a inter-relação entre o comportamento humano e o ambiente que o circunda, seja ele construído ou natural. Através de observações os especialistas estudam como o ambiente afeta a personalidade do indivíduo e também como esse indivíduo afeta o ambiente ao seu redor.
No contexto do nosso estudo nessa parashá, teremos a oportunidade de aprender que o Eterno prepara o caminho e nos encaminha para fazermos a diferença onde formos, e o ambiente, como estamos vendo deve ser afetado também.
A reflexão que desejo que tenhamos é que:
- Avram e Lot influenciaram ou foram influenciados pelo ambiente ao seu redor?
- Faz alguma diferença para aquele que foi chamado pelo Eterno a seguir no caminho da Torah, o ambiente em que ele está inserido?
- Nós na atualidade sofremos essa influência do ambiente? E como devemos agir?
Quando olhamos para essa porção da Torah e para a próxima, podemos perceber como o ambiente pode influenciar e ser influenciado, conforme vimos na transcrição citada anteriormente. Na verdade, entendo que o propósito do Eterno ao transmitir sua Torah ao homem e mandar que ele leve-a aos outros, é exatamente que ele exerça influência divina pela luz da palavra nas pessoas e no ambiente como consequência. Esse é o propósito que vemos em toda a Escritura. Não é à toa que os textos da Toráh são tão proféticos e com apontamentos tão profundos perpassando a história em diversos níveis desde o passado até o futuro, quando o messias e rei ungido pelo criador vier e estabelecer o Reino de D’us.
A VONTADE DE D’US
Até ser reconhecido como “pai da emunah” Avram passou por várias provações em sua vida. E a maioria delas à partir do ambiente que o cercava. Ano passado no estudo dessa parashá eu disse que, o Eterno sempre procura pessoas que possam viver de forma justa e seguir a seus mandamentos fazendo parte de uma nação separada e obediente. No “El Midrash Dice”, que está em espanhol, diz que o Eterno encontrou Avram depois de aguardar dez gerações desde Shem. Este filho de Noach, foi fiel a D’us em toda a sua vida, mas alguns de seus descendentes não, até que veio Avram, mesmo vivendo em uma terra e no meio de um povo pagão, não se misturava com os costumes daquelas pessoas.
O mencionado midrash também diz que, quando Adam e Chavah pecaram, eles fizeram com que a shekhinah se afastasse do primeiro céu, mas Avram trouxe a shekhinah de volta a terra. Adam trouxe morte para a humanidade, mas Avram deu vida ao mundo ao ser hospitaleiro e ao por as pessoas debaixo dessa shekhinah. Percebemos como o patriarca é um apontamento profético para o caráter e ministério de Yeshua Hamashiach ao levar a presença do Eterno pela Torah às pessoas.
Disse também naquela ocasião que, o que podemos ver com o midrash é que a vida de Avram tinha propósito, ao ser chamado pelo Eterno, viver uma vida de justiça e mostrar às pessoas que ele servia ao único D’us. E ele sabia o que isso significava, já que ele viveu em uma terra muito idólatra e padeceu por viver de forma justa naquele lugar. O citado midrash mostra as provas que o Eterno permitiu que Avram passasse, a fim de provar sua fidelidade. Algumas dessas provas aconteceram enquanto ele ainda vivia em Ur dos caldeus, esse patriarca foi contemporâneo de Ninrod, e dentre as provas que passou estava o fato de Avram ser jogado em uma fornalha, ser preso, entre outras. Com isso, devemos entender que quando o Eterno chama Avram em Bereshit 12, ele havia passado por várias provas, mas ainda não todas. E depois de sua saída de Haran de vez, deixando tudo para trás, apesar de ainda levar seu sobrinho Lot, o que lhe custou alguns momentos de problemas e a necessidade de enfrentar uma batalha para salvá-lo, Avram continuou a ser provado pelo Eterno, pois isso o faria crescer em justiça até que alcançou o que lemos em Gn 24:1. E como disse, o ambiente ao redor sempre tentou influenciar, mas o que precisamos observar são as atitudes certas e erradas desse patriarca para aprendermos a agir de forma correta. Afinal, o propósito maior de o Eterno nos dá a Torah, que é instrução, direção e ensino, é nos instruir no caminho correto em meio a um ambiente hostil em que vivemos.
Nossa vida é que deve ser uma influência ao ambiente e nunca o contrário. Aprendemos isso com Avram, e mesmo com todo o problema, também aprendemos com Lót, pois veremos na próxima parashá que mesmo em um ambiente tão corrupto, não deixou de lado o que aprendeu com seu tio Avram acerca dos mandamentos do Eterno. E precisamos agir da mesma forma a cada dia de nossas vidas.
E antes de finalizar vejamos o contexto profético desse assunto que estamos estudando dentro da haftará em Is 40:27-41:16.
Que o Eterno os abençoe e até o próximo estudo!
Pr/Rav Marcelo Peregrino Silva (Marcelo Santos da Silva - Moshê Ben Yosef)
Nenhum comentário:
Postar um comentário