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quinta-feira, 27 de outubro de 2022

Estudo da Parashá Noach (Noé) - As leis de Noach

 


Estudos da Torá


Parashá nº 2 – Nôach (Noé)

Bereshit/Gênesis 6.9-11.32

Haftará (separação) Is 54.1-55.5 e

B’rit Hadashah (nova aliança) Mt 24:36-44 e 1Pe 3:18-22


Tema: As Leis de Noach


RELEMBRANDO


Chegamos à segunda parashá, e esta recebe o nome de Noach, o homem de D’us que recebeu a instrução para construir uma grande arca, algo que ninguém, até aquele momento, nunca tinha visto, ainda mais tão distante do mar.

Noach vivia segundo a vontade do Eterno, obedecia à Torá oral que havia recebido de seus pais. Mesmo em meio à uma sociedade corrupta, ele se mantinha íntegro e bom diante do Eterno, por isso tem sua vida e de sua família salva do dilúvio. Eles reiniciam a humanidade e por dez gerações se mantiveram com a mesma língua, até que uma geração novamente corrupta decide pecar contra o Eterno, desafiando-o, o que levou a divisão das línguas e a separação de povos.


A PARASHÁ DA SEMANA


Vejamos um resumo desta parashá antes de entrarmos em nosso estudo dessa semana.

O Eterno instrui Noach, um homem justo num mundo devastado pela violência e corrupção, a construir uma grande teivah (arca) de madeira, coberta por dentro e por fora com piche. O motivo dessa construção era um grande dilúvio, que o Eterno traria e que varreria toda a vida da face da terra; mas a arca que ele construiria flutuaria sobre a água, abrigando Noach, sua família, que por causa da vida justa dele receberam livramento, e dois membros (macho e fêmea) de cada espécie animal. Dos kasher (limpos) eram 7 pares, conforme lemos em Gn 7:2.

Águas subiram das profundezas da terra, e a chuva caiu durante 40 dias e noites, e as águas irrompem por mais 150 dias antes de se acalmarem e começarem a baixar o nível que tinham atingido, que segundo a Torá, cobriram os montes mais altos, conforme Gn 7:19. A arca chega ao Monte Ararat, e da sua janela Noach envia um corvo, e então pombas, “para verem se as águas baixaram da face da terra.” Quando o solo seca completamente, mais ou menos um ano depois do início do dilúvio, o Eterno ordena Noach a sair da teivah (arca) e repovoar a terra.

Noach constrói um altar e oferece sacrifícios a D'us. HaShem promete nunca mais destruir toda a humanidade por causa de seus atos, e coloca o arco celeste como uma testemunha de Seu novo pacto com o homem. D'us também ordena Noach sobre a santidade da vida: o assassinato é considerado uma ofensa capital, e embora o homem tenha permissão de comer carne, é proibido de comer a carne de um animal vivo e de ingerir sangue.

Noach planta uma vinha, bebeu do vinho e embriagou-se tirando suas roupas. Dois dos filhos de Noach, Shem e Yephet, são abençoados por cobrirem a nudez do pai, enquanto seu terceiro filho, Ham, é punido por tirar vantagem de sua degradação.

Os descendentes de Noach permanecem como um único povo, com um só idioma e cultura, por dez gerações. Então eles desafiam o Criador construindo uma grande torre para simbolizar sua própria invencibilidade e capacidade de chegar até D’us; HaShem confunde sua língua para que “um não compreenda a língua do outro,” fazendo com que abandonem seu projeto e se espalhem pela face da terra, separando-se em setenta nações.

A Parashá Noach finaliza com uma cronologia das dez gerações de Noach a Avram (que mais tarde se tornará Avraham), a jornada de Avraham do local de seu nascimento, Ur dos Kasdim para Kena’an, parando porém em Charan.


Estudo do Texto da Parashá


Quando a terra secou após o dilúvio, um ano após seu início, o Eterno mandou que Noach saísse da arca, e quando saiu, ele construiu um altar e ofereceu sacrifícios de holocaustos de animais puros ao Eterno. E HaShem se agradou do cheiro suave da oferta queimada, conforme podemos ver em Gn 8:20 e 21.


Depois Noé construiu um altar dedicado ao Eterno e, tomando alguns animais e aves puros, ofereceu-os como holocausto, queimando-os sobre o altar. O Eterno sentiu o aroma agradável e disse a si mesmo: "Nunca mais amaldiçoarei a terra por causa do homem, pois o seu coração é inteiramente inclinado para o mal desde a infância. E nunca mais destruirei todos os seres vivos como fiz desta vez.” Gênesis 8:20,21


Depois desse sacrifício que agradou ao Eterno, acontece algo interessante, e isto será o alvo de nosso estudo nessa parashá. A Torá nos mostra o Eterno abençoando a Noach e seus filhos e dando-lhes algumas instruções, como parâmetro para início do repovoamento da terra. O Eterno estava lhes entregando algumas mitsvot, que ficaram conhecidas como “As leis de Noach”. Mas elas constam no texto escrito da Torá? O que elas são, e o que representam? Obedecer apenas essas leis é suficiente para agradar ao Eterno? Se sigo as leis de Noach eu não preciso seguir o exemplo do Messias Yeshua? Mostraremos neste simples estudo como essas mitsvot dadas a Noach e seus filhos são mal interpretadas pelas pessoas dos sistemas religiosos. Porém, vejamos primeiro, um pouco do contexto dessa passagem da Torá, contida nessa parashá.


D’us abençoou Noach e seus filhos, dizendo-lhes: "Sejam férteis, multipliquem-se e encham a terra. Todos os animais da terra tremerão de medo diante de vocês: os animais selvagens, as aves do céu, as criaturas que se movem rente ao chão e os peixes do mar; eles estão entregues em suas mãos. Tudo o que vive e se move lhes servirá de alimento. Assim como lhes dei os vegetais, agora lhes dou todas as coisas. "Mas não comam carne com sangue, que é vida. A todo que derramar sangue, tanto homem como animal, pedirei contas; a cada um pedirei contas da vida do seu próximo. "Quem derramar sangue do homem, pelo homem seu sangue será derramado; porque à imagem de D’us foi o homem criado. "Mas vocês, sejam férteis e multipliquem-se; espalhem-se pela terra e proliferem nela".” Gênesis 9:1-7


Repare que no primeiro verso desse trecho a Torá nos mostra o Eterno abençoando Noach e seus filhos. A palavra que aparece no texto hebraico traduzida aqui para abençoar é “vayvarech”, essa palavra é uma variação que vem do radical “barak”, que significa “dar poder à alguém para ser próspero, bem sucedido, fecundo; abençoar”. Note que quando o Eterno abençoa com a mencionada palavra, ele ainda diz para Noach e seus filhos “frutificarem, serem fecundos e encherem a terra”. A palavra de bênção liberada por D’us era dupla, ou seja, ele ministrou a frutificação e a multiplicação de seus filhos, com o objetivo de encherem a terra. E isso era uma recompensa advinda da obediência em seguir as palavras do Eterno no ato de construir a arca e cuidar dos animais durante todo o tempo em que a inundação ocorreu.

Na mencionada bênção, do verso 2, o Eterno ainda dá a Noach e a seus filhos a autoridade sobre os seres vivos, fazendo uma reafirmação da promessa de governar a todos os animais, dada a Adam no Éden, conforme lemos em Gn 1:28:


D’us abençoou, e lhes disse: sejam férteis e multipliquem-se! Encham e subjuguem a terra! Dominem sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu e sobre todos os animais que se movem pela terra.”.


Vemos que no verso 2, o Eterno disse que os animais teriam medo e temor do homem, pois lhes foram entregues, mas repare que essa entrega não estava dizendo a respeito apenas à autoridade do homem em relação aos animais, mas também ao fato de agora eles serem entregues como alimento ao homem. Até aquele momento o ser humano só se alimentava de vegetais, mas agora o Eterno havia dado os animais puros como alimento para o ser humano.

Assim, conforme já mencionamos, esse reinício estava sendo com algumas recomendações, instruções que o Eterno passou a Noach e as seus filhos para que seguissem e ensinassem aos descendentes. Essas instruções ditas pelo Eterno no texto de Bereshit 9 eram expressões da vontade de D’us que deveriam ser seguidas pelo homem, as quais relaciono a seguir:

- Não comer a carne com sua vida, ou seja, o sangue.

Como até esse momento não se comia carne, entendemos que esse era um mandamento que estava sendo dado naquele momento. E o conteúdo que deve ser entendido, não é apenas comer carne crua ou com sangue, nem mesmo o sangue em si, mas o entendimento do texto hebraico e de acordo com os ensinos antigos do povo, é que não se pode comer uma parte do animal com ele ainda vivo. E vemos isso em algumas versões de textos de Bereshit.

- Não derramar sangue, ou seja, cometer assassinato.

Este mandamento ou lei, era algo que já havia sido dado, desde a morte de Abel. Mas os homens transgrediram em muito esse mandamento antes do dilúvio, não é à toa que o texto da Torá afirma que a terra estava cheia de violência em Gn 9:11. Porém, o Eterno estava reafirmando a Noach e a seus filhos, qual sua vontade a esse respeito, e deixa muito claro que ele iria requerer daquele que cometesse assassinato o sangue derramado.

Vemos no texto da Torá mencionado anteriormente, que aparecem apenas esses dois mandamentos, no entanto, o que é conhecido como “as leis de Noach”, são sete leis.

De acordo com o site Chabad, o judaísmo considera alguns princípios como base da fé, ética e moral universais, que devem ser difundidos por toda a humanidade, para garantir a existência pacífica e justa entre as nações. Segundo eles, apesar de existirem inúmeros preceitos divinos, sete deles ultrapassam as fronteiras da fé judaica e foram ordenados por D’us para toda a humanidade. No judaísmo, acredita-se que quando todas as nações do mundo seguirem esses sete preceitos básicos, garantiremos um mundo ideal para viver. Segue então, as sete leis relacionadas abaixo e o seu entendimento básico:

- Não praticar idolatria

O termo idolatria não quer dizer apenas adorar ídolos. Isso era um costume pagão antigo. Não praticar idolatria significa manter a fé e a confiança absolutas em D’us e na sua providência. E nesse sentido, comer coisas sacrificadas também conta como idiolatria.

- Não blasfemar contra D’us

É muito comum que uma pessoa ao passar por dificuldades em primeiro lugar jogue a culpa em D’us. Na verdade tudo o que ocorre vem de D’us, mas Ele é o exemplo máximo de bondade e saberá que com um pouco de treino podemos enxergar como as coisas vêm para o bem e que o Criador deve ser agradecido por Sua benevolência.

- Não cometer homicídio

O contexto é não cometer assassinato, derramando assim o sangue de outro homem.

- Não roubar

Não se apossar daquilo que pertence a outra pessoa.

- Não cometer adultério e não manter relações sexuais ilícitas

O contexto aqui é qualquer relação sexual ilícita, seja dentro ou fora do casamento, com pessoas do mesmo sexo ou mesmo com animais.

- Estabelecer tribunais

Quando existe uma divergência entre duas partes, não se tem o direito de agir por conta própria, nem privilegiar um dos lados no julgamento. Como existe uma forte tendência do ser humano de agir por amor próprio, escondendo seus próprios erros, às vezes é muito difícil identificar quem tem razão. Por isso, para a convivência harmoniosa entre as pessoas, são necessários tribunais justos e honestos. Órgãos neutros, dirigidos por pessoas idôneas que tem o poder de trazer a paz entre os homens, garantindo uma existência saudável entre os homens.

- Não molestar os animais ingerindo um órgão retirado em vida

O Eterno proibiu ao homem maltratar ou torturar um animal, nem fazê-lo sofrer. Portanto, ao extrair a carne ou órgão de qualquer animal para ingeri-lo, deve-se ter certeza absoluta de que ele não sofra, devendo fazê-lo somente após sua completa morte. Quem não se importa com o sofrimento de um animal, desrespeitando a obra da criação, não terá também respeito aos seres humanos que o cercam

Perceba com tudo isso que mostramos acima, e comparando com o texto em estudo, que em Gn 9 trás duas das sete leis de Noach, e mostramos as sete através dos olhos do judaísmo extraídas do site Chabad. Então, de onde se tiram as outras quatro leis, se elas não estão no texto?

Quando olhamos para essas sete leis, podemos perceber que elas estão enquadradas dentro dos 613 mandamentos, porém até aquele momento eles só tinham sido dados pela forma oral, ainda não tinha nada escrito. Assim, entendemos que essas leis vieram da Torá oral, e certamente Noach conhecia essas leis, e nesse episódio o Eterno estaria então reafirmando-as através dessas duas leis ditas no texto.

Essas sete leis são, na verdade, um início do cumprimento da vontade de HaShem, que é expressa na Torá, ou seja, elas são os primeiros passos para entrar no caminho que o Eterno preparou, que é a própria Torá, ou uma vida de obediência. Os judeus dizem que elas são uma herança sagrada universal, um código que toda pessoa na face da terra pode usar como base para sua vida espiritual, moral e pragmática. Mas isso olhando meramente desse jeito, deixa uma série de questões. Já que a Torá é para todos que desejam seguir o caminho do Eterno, e não somente para o povo de Israel ou o povo judeu. E na fala dos judeus, as sete leis de Noach são para as nações não judias, porque a Torá é somente para os judeus. E isso não é verdade, pelo que vemos na própria Torá, nos profetas e nos escritos nazarenos. Veja os seguintes versos:


A mesma Torá se aplicará ao natural da terra e ao estrangeiro residente”. Ex 12:49


Vocês terão a mesma Torá para o estrangeiro e para o natural. Eu sou o Eterno, o D’us de vocês”. Lv 24:22


A mesma Torá e ordenanças se aplicará tanto a vocês como ao estrangeiro residente.” Nm 15:16


Quanto ao estrangeiro, que não pertence ao teu povo Yisrael, e que veio de uma terra distante por causa do teu nome, pois ouvirão acerca do teu grande nome, da tua mão poderosa e do teu braço forte, quando vier e orar voltado para este templo, ouve dos céus, lugar da tua habitação, e atende o pedido do estrangeiro, a fim de que todos os povos da terra conheçam o teu nome e te temam, como faz Yisrael, teu povo, e saibam que este templo que construí traz o teu nome.” 1Rs 8:41-43


Assim que me ouvem, me obedecem; são estrangeiros que se submetem a mim.” Sl 18:44


E os estrangeiros que se unirem ao Eterno para servi-lo, para amarem o nome do Eterno e para prestar-lhe culto, todos os que guardarem o sábado sem profaná-lo, e que se apegarem à minha aliança, esses eu trarei ao meu santo monte e lhes darei alegria em minha casa de oração. Seus holocaustos e seus sacrifícios serão aceitos em meu altar; pois a minha casa será chamada casa de oração para todos os povos.”. Is 56:6 e7


Portanto, vocês já não são estrangeiros nem forasteiros, mas concidadãos dos santos e membros da família de D’us,” Ef 2:19


Note que a revelação vem sendo dada de maneira gradativa, evoluindo até a época do messias e dos apóstolos. De acordo com cada texto que acabamos de mencionar o estrangeiro que deseja ser parte do povo do Eterno deve cumprir a Torá. Infelizmente há algumas pessoas que acreditam que basta seguir as sete leis de Noach que já estarão agradando a HaShem, sem que precisem cumprir seus outros mandamentos. Essas pessoas, muitas vezes ensinadas por judeus, acreditam que a Torá é somente para o povo judeu, como já disse. Mas estamos vendo aqui, que na época de Noach, essas sete leis dadas eram o início, para que a humanidade reiniciasse de forma a começar a seguir o caminho correto, pois no tempo apropriado as demais leis seriam reveladas gradualmente.

Reflita um pouco em algumas coias:

Será mesmo que só as sete leis seriam suficientes?

Como fica o shabat, e as festas que o Eterno instituiu como encontros marcados com ele?

Como ficam os mandamentos do Shemah, do Tsitsit, e outros cabíveis a cada pessoa?

Uma pessoa que obedece apenas as sete leis de Noach, segundo alguns textos que vimos acima, não pode fazer parte do povo da aliança, simplesmente por não pertencer à aliança do Eterno com seu povo. Essa aliança é mostrada através do cumprimento da Torá.

Algumas pessoas também alegam que as sete leis de Noach são uma aliança do Eterno com a humanidade, porém isso é um engano, e demonstram falta de conhecimento do que diz o texto da Torá neste capítulo 9 de Bereshit, veja:


"Vou estabelecer a minha aliança com vocês e com os seus futuros descendentes, e com todo ser vivo que está com vocês: as aves, os rebanhos domésticos e os animais selvagens, todos os que saíram da arca com vocês, todos os seres vivos da terra. Estabeleço uma aliança com vocês: Nunca mais será ceifada nenhuma forma de vida pelas águas de um dilúvio; nunca mais haverá dilúvio para destruir a terra". E Deus prosseguiu: "Este é o sinal da aliança que estou fazendo entre mim e vocês e com todos os seres vivos que estão com vocês, para todas as gerações futuras: o meu arco que coloquei nas nuvens. Será o sinal da minha aliança com a terra.” Gn 9:9-13


Vemos que é sim, uma aliança com a humanidade, mas essa aliança diz respeito a não eliminar mais os seres vivos, homens e animais, por meio de dilúvio. Esta não é uma aliança que estabelece promessas para o futuro ou de pertencimento ao Reino do Mundo Vindouro.

Então devemos ter plena compreensão de que as sete leis de Noach, como já mencionei anteriormente, são apenas o princípio do caminho de obediência à Torá, ou seja, o início dos atos de obediência da pessoa que deseja servir ao Eterno, enquanto ela começa o aprendizado da Torá em sua plenitude com suas práticas de justiça. Os apóstolos do messias entendiam dessa mesma forma, pois vemos Tiago, fazendo menção à algumas dessas sete leis em Atos 15, durante o chamado concílio de Jerusalém, observe:


Quando terminaram de falar, Tiago tomou a palavra e disse: "Irmãos, ouçam-me. Simão nos expôs como D’us, no princípio, voltou-se para os gentios a fim de reunir dentre as nações um povo para o seu nome. Concordam com isso as palavras dos profetas, conforme está escrito: Depois disso voltarei e reconstruirei a tenda caída de Davi. Reedificarei as suas ruínas, e a restaurarei, para que o restante dos homens busque o Eterno, e todos os gentios sobre os quais tem sido invocado o meu nome, diz o Eterno, que faz estas coisas’ conhecidas desde os tempos antigos. "Portanto, julgo que não devemos pôr dificuldades aos gentios que estão se convertendo a D’us. Pelo contrário, devemos escrever a eles, dizendo-lhes que se abstenham de comida contaminada pelos ídolos, da imoralidade sexual, da carne de animais estrangulados e do sangue. Pois, desde os tempos antigos, Moisés é pregado em todas as cidades, sendo lido nas sinagogas todos os shabatot".” Atos 15:13-21


Estava acontecendo um debate entre os shaliachim (apóstolos) e alguns irmãos do grupo dos fariseus que haviam crido que Yeshua é o messias. Esses fariseus estavam ensinando aos gentios, que vinham se achegando ao Eterno, que para serem salvos eles deveriam passar pela brit milah (circuncisão) logo que iniciavam a caminhada. Para uma explicação um pouco mais detalhada sobre esse assunto, procure em nossos canais no YouTtube (Sou Peregrino na Terra e Kahal Teshuvah Brasil), o vídeo da live que fizemos sobre o capítulo 1 da epístola de Paulo aos Gálatas, pois ali eu explico sobre essa passagem de Atos 15.

Entendendo um pouco do contexto dessa passagem de Atos, podemos perceber que Tiago, sabendo do que dizia a Torá oral, e a própria Torá escrita, e também reconhecia a carga de legalismo que havia no meio de alguns líderes judaicos de sua época, falou contra o legalismo que exigia a circuncisão no início da vida com D’us. E assim, propôs naturalmente, como deveria ser, que os gentios que estavam se convertendo a D’us pelo testemunho de Yeshua levado pelos apóstolos, deveriam iniciar essa caminhada cumprindo 4 mitsvot tirados das sete leis de Noach. O entendimento de que aquilo era apenas o início do cumprimento, se dá no final da fala de Tiago, que diz que Moisés é ensinado todo shabat nas sinagogas. Moisés ali, é um adjetivo para Torá, e isso indica que os gentios frequentavam os ensinos nas sinagogas e assim iriam aos poucos aprendendo com o ensino da Torá e praticando os mandamentos até que tivessem entendimento e pudessem fazer a circuncisão com conhecimento e práticas verdadeiras.

Portanto, vimos claramente que as leis de Noach não são em si, a liberação do Eterno para os gentios deixarem de cumprir Torá, pelo contrário, mostramos que a Torá é para todo aquele que quer ser servo de HaShem e pertencer ao seu reino. E que há profecias que dizem que estrangeiros se aproximarão do Eterno e viverão através de seus mandamentos. E nesse contexto as leis de Noach são apenas o início da entrada na aliança do Eterno com seu povo, e não a aliança em si. Mostramos também que a aliança feita com Noach e seus descendentes era quanto a não haver mais dilúvio para eliminar a vida na terra.


Que possamos aprender com essa parashá a viver de acordo com os decretos do Eterno.


Que HaShem lhes abençoe!


Pr. Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)


Bibliografia:


- Torá – Lei de Moisés. Editora Sefer

- El Midrash Dice Bereshit – O Midrash disse

- http://hebraico.top/biblia-hebraica-online-transliterada/

- https://pt.chabad.org/library/article_cdo/aid/771005/jewish/Resumo-da-parasha-noach

- https://pt.chabad.org/library/article_cdo/aid/3312135/jewish/As-Sete-Leis-de-No.htm

- https://pt.chabad.org/library/article_cdo/aid/3558909/jewish/As-sete-leis-universais.htm

quarta-feira, 19 de outubro de 2022

Estudo da Parashá Bereshit - O Ruach do Eterno

 



Estudos da Torá

Parashá nº 1 – Bereshit (No Princípio)

Bereshit/Gênesis 1.1-6.8

Haftará (separação) Is 42.5-43.10 e

B’rit Hadashah (nova aliança) Mt 1:1-23 e Jo 1:1-2


Tema: O Ruach do Eterno


Essa semana reiniciamos o ciclo anual de estudos da Torá. E inicialmente, quero fazer uma breve introdução.

Para muitos será mais um ano de estudos, para alguns que iniciaram sua teshuváh no ciclo passado, esse será o segundo ano. O mais importante é que você está seguindo pelo caminho que o Eterno o colocou. A você que está iniciando os estudos da Torá nesse ano, temos no meu blog: SouPeregrinonaTerra.blogspot.com.br, todos os estudos do ciclo passado publicados lá em texto, e estão disponíveis para pesquisa além de muitos outros estudos. Também os estudos estão disponíveis em vídeo nos canais do YouTube Sou Peregrino na Terra e Kahal Teshuvah Brasil.

A todos eu digo, prepare-se para mais um ano de muito estudo das Escrituras Sagradas, de aprendizados, de respostas e principalmente, de muita prática na obediência aos mandamentos do Eterno. Entenda que de nada adianta aprender sobre as Escrituras se não colocar o aprendizado em prática. A cada porção semanal teremos um novo aprendizado ao qual precisamos começar a praticar.

No ciclo passado vim trazendo os conceitos iniciais de cada parashá, mostrando algumas palavras principais nas porções e dando um princípio prático. Esse ano, já estaremos pegando algum tema dentro de cada parashá ou das porções dos profetas e mesmo da Brit Hadashah para crescimento do nosso aprendizado.

Então, iniciemos com todo amor, zelo e dedicação o estudo desse novo ciclo.


RELEMBRANDO

Para os que já sabem será uma relembrança, para os que ainda não sabem será uma apresentação ao conhecimento.

O termo “Parashá” é uma palavra no singular que vem do hebraico e significa porção, no plural é “Parashiot”, significando porções.

O ciclo anual de estudos da Torá possui 54 parashiot ou porções de estudos semanais, que iniciam no primeiro dia da semana e encerra no shabat semanal. Cada porção semanal possui 7 porções menores chamadas de aliot, plural de aliá, que significa subida. Porque iniciamos a leitura e a meditação nas linhas da Torá desde o primeiro dia da semana, e vamos subindo uma a uma, dia a dia, até chegar na última que é lida no shabat. É importante ter isso em mente para que possamos compreender como devemos levar a sério o mandamento de estudar a Torá, conforme lemos no livro de Josué.


Não deixe de falar as palavras deste Livro da Lei e de meditar nelas de dia e de noite, para que você cumpra fielmente tudo o que nele está escrito. Só então os seus caminhos prosperarão e você será bem sucedido.” Js 1:8


Por isso reúna com sua família e medite nas Escrituras durante a semana, lendo cada uma das aliot e suas separações ou haftarot dos profetas e sugestões dos Escritos Nazarenos. E se você estiver sozinho em teshuváh, não desanime, pois o Eterno é contigo, estude assim mesmo e seja luz para outros. Há uma multidão no engano do sistema religioso precisando serem despertados, mas você precisa se preparar e praticar.


A PARASHÁ DA SEMANA


Como falado logo no início, essa semana estudamos a primeira parashá, chamada de Bereshit que significa no início ou no princípio. Bereshit é o nome do livro e o nome da porção, assim como é a primeira palavra que aparece no texto em hebraico. Este é o livro dos começos. Ele conta o começo da criação, o começo da vida do homem, o começo da transgressão ou pecado, o começo de uma família que reiniciou a humanidade, o começo dos que buscam a D’us, e o começo do povo hebreu. Assim, iniciamos o estudo da Torá pelo livro dos inícios, e na Torá do Eterno durante esse ciclo, conforme já disse encontraremos muitas respostas para perguntas que nunca foram respondidas pelas teologias do sistema religioso.

Segundo o Rabino Isaac Dichi, no Pirkê Avot (Ética dos pais), os sábios de Yisrael dizem “Hafoch bah vehafoch bah, dechola vah”, ou seja, todas as ciências encontram-se na Torá. É necessário apenas revirar bem suas folhas para encontrarmos o que desejamos. Por isso a estudamos diariamente, semanalmente, anualmente. A Torá, tanto a Escrita quanto a oral, ainda de acordo com o mencionado autor, trata de inúmeros assuntos. Os que se dedicam no seu estudo sabem que, quando surge algum problema, basta abrir o lugar adequado para encontrar a resposta. Com isso, compreenda que nas Escrituras Sagradas obtemos as respostas.


Estudo do Texto da Parashá


No princípio, D’us criou os céus e a terra. A terra era informe e vazia, havia trevas sobre a face da profundeza, e o espírito de D’us pairou sobre a superfície da água.” Bereshit/Gn 1:1,2


O primeiro verso nos mostra que o Eterno, o criador de todas as coisas, criou no início de tudo, os céus e a terra. E às vezes podemos ser levados a pensar que ali ele criou tudo, porém o entendimento no contexto original é mais amplo e profundo. O comentário da Torá da Editora Sêfer, a respeito desse primeiro verso, diz que nele vemos a intenção evidente de dar ao homem a consciência de que tudo se deve à Criação Divina. Os mitos antigos atribuem a existência do mundo ao resultado das lutas dos múltiplos deuses, ou como nascido da casualidade e do capricho. Porém, ainda de acordo com o comentário, a Torá quer nos mostrar o Universo como expressão da vontade Divina, a Criação como princípio de tudo, e não a Criação em si, mas a Providência, isto é, o próprio D’us, como Criador, Legislador e Condutor do Universo.

Com isso, podemos inferir que dessa maneira, o Eterno sendo o criador e não tendo uma forma definida, pois é espírito (ruach), se aproveitou disso para executar a obra da criação. E a Torá está nos mostrando isso claramente, dessa maneira falaremos um pouco neste estudo da parashá Bereshit sobre o Ruach do Eterno.

Ainda precisamos ver algo antes de adentrar no assunto propriamente dito. No verso 2 lemos a palavra “vã” ou na tradução que usamos acima “informe”, em outras traduções temos os termos “sem forma e vazia”. O termo “vã” vem da interpretação da tradução aramaica de Onkelos, segundo o cometário da Torá da Editora Sêfer, o exegeta Rashi explica que a palavra hebraica “tohu” (vã) traz o significado de assombro e consternação pela vacuidade ou vazio em que se encontrava a terra. Isto quer dizer que, ao ser criada a terra pelo Eterno, ela estava vazia, não tinha nada a não ser provavelmente, uma coisa, que veremos adiante.

E podemos fazer uma pergunta: Como no verso 2 diz que o ruach se movia sobre a face das águas, se o texto do verso 1 diz que o Eterno criou os céus e a terra? De onde veio a água, se ela ainda não tinha sido criada?

Na verdade as águas foram criadas no mesmo momento dos céus. Observe que em hebraico temos o seguinte no verso 1: “Bereshit bará elohim et hashamayim veet haarets.” Repare na palavra sublinhada “hashamayim” que significa “os céus”, observe que “ha” é o artigo definido plural “os”, e “shamayim” é o substantivo “céus”. No entanto, dentro dessa palavra há uma outra palavra que representa o elemento “água”. Em hebraico “águas” é “mayim”. Por isso quando lemos que o Eterno criou “hashamayim”, podemos inferir perfeitamente que estava criando tanto “os céus” como também “as águas”, no mesmo momento. O hebraico responde muitas coisas. Nesse sentido, há ainda interpretações de rabinos antigos que afirmam que as águas já existiam antes da criação dos céus e da terra.

Então, tendo entendido um pouco do princípio da criação relatada no verso 1 e da primeira parte do verso 2, nos voltemos à segunda parte do verso 2, que diz: “...e o espírito de D’us pairou sobre a superfície da água.” Em outras versões lemos: “...e o espírito de D’us se movia sobre a face das águas.”

A expressão “...e o espírito de D’us se movia…” é de difícil entendimento para muitos tradutores, pois tem um sentido de difícil captação por causa da nossa limitação para compreender a infinitude do Eterno. Mas também ocorre a falta de entendimento por causa da ausência de estudo e compreensão da Torá e dos profetas em seu contexto original, ou seja, o contexto da cultura da época, o contexto judaico.

Segundo Rashi, a expressão aponta para que o trono Divino(representação de autoridade, poder), que movia-se por ordem de D’us e por meio de alento ou ruach (sopro, vento) exalado por sua boca, sobre a face das águas, aparentemente para dar alento da vida à matéria inanimada, conforme podemos ler em Gn 2:7 e Isaías 42:5, abaixo:


Então o Eterno D’us formou o homem do pó da terra e soprou em suas narinas o fôlego de vida, e o homem se tornou um ser vivente.” Gn 2:7


É o que diz D’us, o Eterno, aquele que criou o céu e o estendeu, que espalhou a terra e tudo o que dela procede, que dá fôlego aos seus moradores e vida aos que andam nela:” Isaías 42:5


Ainda segundo o mencionado comentário da Torá, a tradução aramaica de Ionatan bem Uziel diz: “...e o espírito de misericórdia procedente de D’us soprava sobre a face das águas.” E Rashi, ainda propõe que o primeiro versículo de Bereshit/Gênesis, seja traduzido assim: “No princípio, ao criar D’us os céus e a terra, a terra era vã ...”, isso pois, segundo ele, as Escrituras Sagradas não querem mostrar a ordem da Criação, e a prova disso é o final do segundo versículo, que sugere que as águas já existiam antes dos céus e da terra. Sendo assim, vemos que o ruach ou espírito do Eterno estava se movendo ou soprando, sobre algo que fora criado e que a possível intenção era dar vida, gerar a vida, uma vez que a água é o apontamento para a Torá, que é o elemento purificador que dá vida a tudo.

Mas precisamos então, entender o contexto correto de “espírito” dentro do visão da Torá e dos profetas, para termos uma compreensão mais ampla do que está acontecendo aqui nestes primeiros versos da Torá.

Desde que o sistema religioso foi criado e também as doutrinas dogmáticas que firmam esse sistema, que o ensino e compreensão das pessoas acerca de “espírito” é muito diferente do que dizem as Escrituras e o povo para quem elas foram escritas. No meu canal no YouTube, Sou Peregrino na Terra, temos dois vídeos que tratam sobre esse tema, com o título: “O que as Escrituras falam sobre espírito?”

O entendimento da maioria das pessoas é que espírito seria uma forma espectral, espiritual dos corpos. Para eles seria um corpo formado de matéria desconhecida, que tem vida própria. Segundo o site Yeshua Melekh, algumas pessoas enfeitam um pouco mais o assunto, atribuindo a estes corpos asas para que eles possam voar. Será que essas ideias religiosas dos sistemas religiosos estão de acordo com as Escrituras?

Vejamos então, primeiramente uma definição. O termo hebraico que geralmente é traduzido como “espírito” é “ruach” - ר֫וּחַ que também significa “vento, sopro, mover e poder”. Assim, o termo ruach pode ter os seguintes significados: “espírito, vento, sopro, mover e poder. E de fato, encontramos nos textos sagrados essa palavra com tais contextos. Vamos analisar alguns trechos com o termo “ruach” ou com suas variações no hebraico, que colocarei entre colchetes.

O primeiro trecho que vamos verificar está em Mish’le Shelomoh/Provérbios 15:4, veja:


"A língua benigna é árvore de vida, mas a perversidade nela deprime o espírito[beruach]."


O termo בְּרֽוּחַ - beruach é a preposição “be” – “em”, mais o radical da palavra “ruach”. Temos ainda outro texto em Shemot/Êxodo 14:21, que diz:


Então Moshê estendeu a sua mão sobre o mar, e o Eterno fez retirar o mar por um forte vento[beruach] oriental toda aquela noite; e o mar tornou-se em seco, e as águas foram partidas."


Ainda podemos ver também outro texto em Yov/Jó 15:30:


"Não escapará das trevas; a chama do fogo secará os seus renovos, e ao sopro[beruach] da sua boca desaparecerá."


Perceba que o contexto é bem transparente nas duas últimas referências citadas, não deixando dúvidas sobre a tradução. O fato é que “ruach” tem o significado de “vento” e “sopro”. E talvez então, você se pergunte: “Não temos dentro de nós um espírito, mas um sopro?” E eu te respondo com o texto da Torá, veja:


E formou o Eterno Elohim o homem do pó da terra, e soprou em suas narinas o fôlego da vida; e o homem foi feito alma vivente.” Gn 2:7


Note um fato importante, de maneira nenhuma o texto está nos falando que temos um espectro dentro de nós, pelo contrário, nos diz que o Eterno soprou vida no homem. Veja que nem mesmo o termo “ruach” está neste verso.

O termo “ruach” precisa ser entendido dentro do seu contexto original, o pensamento semita. E dentro deste contexto “ruach” não significa um ser espiritual ou espectral, mas sim, vento ou sopro. Podemos entender que o vento não pode ser visto e nem tocado, quando ele sopra nós apenas o ouvimos e sentimos, mas não sabemos ao certo de onde vem ou pra onde vai. Por isso, Yeshua usa a metáfora do vento em Jo 3:8 ao se referir sobre os que são nascidos de D’us, ou do espírito, veja:


O vento sopra onde quer. Você o escuta, mas não pode dizer de onde vem nem para onde vai. Assim acontece com todos os nascidos do espírito”. João 3:8


Preste atenção ao fato de Yeshua usar o vento que sopra em um exemplo para algo maior. O entendimento que vem do Eterno não sabemos também de onde vem, e nem para onde vai nos conduzir, pois é algo que está além de nossos planos. Com isso, repare que já podemos compreender o termo “ruach” além de “vento e sopro”, podemos vê-lo também com o significado de “mover” ou “motivação”. Observe mais um texto, agora do profeta Yeshayahu/Isaías:


"Quando o Eterno lavar a imundícia das filhas de Tziyon, e limpar o sangue de Yerushalayim, do meio dela, com o espírito [beruach] de justiça, e com o espírito [uberuach] de ardor." Yeshayahu/Is 4.4


Observe que, claramente no verso acima o termo “ruach” não tem a intenção de mostrar um ser espiritual ou um espectro, mas um “mover” de justiça e um “mover” de ardor. O que Isaías está querendo mostrar em sua fala profética? Ele está mostrando que o mover de justiça fará com que as pessoas busquem justiça com ardor, ou seja, buscar obedecer a Torá do Eterno fervorosamente, e isso não tem nada a ver com seres espectrais. Retornemos portanto, a um texto na Torá, no livro de Shemot/Êxodo:


Falarás também a todos os que são sábios de coração, a quem eu tenho enchido do espírito [ruach] da sabedoria, que façam vestes a Aharon para santificá-lo; para que me administre o ofício sacerdotal.” Ex 28:3


Aqui nesse verso que citamos, também podemos perceber que o termo “ruach” significa um mover de sabedoria, e nada de espírito como um ser espectral. Outro fato importante que precisa ser observado, é que este verso como na maioria das versões é traduzido de forma tendenciosa ao mencionar a qualidade ou adjetivo do “espírito”. O cristianismo entende como “espírito da sabedoria”, que seria outro nome para a terceira pessoa da trindade, conhecido por eles como “espírito santo”. Entretanto, quando vamos para o contexto original da língua hebraica e da cultura do povo, o entendimento verdadeiro fica muito claro. Observamos no hebraico que não existe o artigo definido, veja ר֣וּחַ חָכְמָ֑ה ruach chakh’mah. Aqui, a tradução correta deveria ter siso “espírito de sabedoria”, sem o artigo definido, o que nos leva ao entendimento que o “mover de sabedoria” não se trata de um ser, uma pessoa, mas uma motivação, uma intenção do Eterno.

Com isso, através da mesma linha de raciocínio, também podemos compreender que ruach hakodesh, geralmente traduzido como “espírito santo”, e geralmente colocam em maiúscula, deve ser entendido como “espírito do santo”, “espírito da santidade” ou “mover do santo”. E claramente, não é um ser a parte do Eterno, já que é dele, ou seja, o mover do Eterno. É o poder dele sendo manifesto. É o próprio Eterno realizando seu mover, destruindo assim, com um dos principais dogmas do sistema religioso, ou seja, a terceira pessoa da trindade. Note ainda que o próprio Yeshua diz que o Eterno é espírito ou ruach, veja:


No entanto, está chegando a hora, e de fato já chegou, em que os verdadeiros adoradores adorarão o Pai em espírito [beruach] e em verdade. São estes os adoradores que o Pai procura. D’us é espírito [ruach], e é necessário que os seus adoradores o adorem em espírito [beruach] e em verdade”. Jo 4:23,24


Porém, nem todo ruach ou mover, vem do Eterno, segundo o site Yeshua Melekh, algumas vezes o mover pode surgir do nosso próprio entendimento. Vejamos alguns versos na Torá que nos comprovam isso.


"Fala aos filhos de Yisra’el, e dize-lhes: Quando a mulher de alguém se desviar, e transgredir contra ele, de maneira que algum homem se tenha deitado com ela, e for oculto aos olhos de seu marido, e ela o tiver ocultado, havendo-se ela contaminado, e contra ela não houver testemunha, e no feito não for apanhada, e o espírito[ruach] de ciúmes vier sobre ele, e de sua mulher tiver ciúmes, por ela se haver contaminado, ou sobre ele vier o espírito[ruach] de ciúmes, e de sua mulher tiver ciúmes, não se havendo ela contaminado," Bemidbar/Nm 5:12-14


Repare bem que o texto deixa claro para nós, que o ruach de ciúmes é um mover que surge no próprio homem. Este ciúmes pode ser devido a uma suspeita apenas ou pode ter uma base verdadeira, mas o fato é que houve um mover que motivou o homem a sentir o ciúmes, por esse motivo a Torá o chama, conforme algumas traduções, de “espírito de ciúmes”, ou em uma tradução mais correta, “mover de ciúmes”. Diferentemente do que o sistema religioso ensina para as pessoas, o “espírito de ciúmes” não é uma entidade maligna, pois não dá motivo algum no texto para se interpretar dessa maneira. Vejamos outro texto que mostra como o “mover” pode surgir da compreensão humana.


Ora, sendo Esav da idade de quarenta anos, tomou por mulher a Yehudhith, filha de Be’eri, heteu, e a Bashemath, filha de Elon, heteu. E estas foram para Yitz’chak e Riv’kah uma amargura de espírito[ruach].” Bereshith/Gênesis 26.34-35


A fazer menção das esposas de Esav, a Torá diz que elas trouxeram para os pais dele uma “amargura de espírito”. Como podemos entender isso? As esposas de Esav foram péssimas noras, e isso gerou tristeza em Yitz’chak e Riv’kah. O reconhecimento de que elas eram péssimas noras foi o fato gerador da “amargura de espírito”, e isso nada tem a ver com um ser ou entidade espiritual amargurado ou que gere amargura, a situação levou ao sentimento. Sendo portanto, o termo “ruach” aqui nesses versículos a suspeita e o sentimento de amargura.

Também podemos destacar que nos escritos nazarenos, conhecidos como Novo Testamento, onde o termo “ruach” foi mal traduzido e por isso, mal interpretado, veja:


porque por meio do Messias Yeshua a lei do espírito [ruach] de vida me libertou da lei do pecado e da morte. Rm 8:2


Perceba que Rav Sha’ul, o apóstolo Paulo, estava falando em seu ensino aos nazarenos de Roma, que por causa da vida justa de Yeshua, o messias, a lei do mover de vida o tinha libertado da lei do pecado e da morte. Ele não estava falando de um ser, uma entidade, mas que por causa do que Yeshua fez, o mover ou poder de vida o tinha libertado. E repare ainda, que as traduções, tendenciosamente, trazem em alguns textos a palavra “espírito” com letra maiúscula a fim a corroborar com o dogma de que é uma pessoa, um ser espectral ou espiritual, e que faz parte de uma trindade.

Assim, é possível ver claramente, que a forma do entendimento comum que as pessoas recebem no sistema religiosos a respeito de espírito, está bastante distante daquilo que as escrituras nos informam dentro do contexto original. As Escrituras Sagradas há milhares de anos atrás nos revelam um entendimento que as pessoas na modernidade ainda não foram capazes de compreender. Se a Torá e os profetas são a nossa base de fé, então devemos entender o que as Escrituras dizem a respeito de espírito, e a mesma nos mostra que espírito é um vento, sopro, mover ou poder, e não um “ser”, uma “entidade” espectral. Nossa compreensão, no contexto das Escrituras, a esse respeito, deve ser a de que o termo espírito aparece, entre outras, das seguintes formas:

- Um vento ou sopro;

- Um sopro que pode representar vida;

- Um mover que vem do Eterno;

    - Um mover que surge no próprio homem;

    - Um mover que gera suspeita ou o próprio sentimento de suspeita; e

    - Um mover que gera sentimentos, tendo ou não a ação do homem.

Por isso, ao nos voltarmos para o texto dessa parashá que estamos estudando, onde a Torá nos fala que o “...e o espírito de D’us se movia sobre a face das águas. estamos na verdade, vendo a Torá nos mostrando que, o vento de D’us, ou o mover de D’us, ou o poder de D’us, ou o sopro de D’us se movia sobre a face das águas. E que esse ruach ou mover do Eterno estava gerando o processo de criação para quando o Eterno falasse “haja” a execução da criação acontecesse. Era o poder o Eterno fluindo como um sopro, um alento sobre as águas, aguardando o momento correto para criar. Não era uma pessoa de D’us, como o dogma trinitariano tenta mostrar. Não era uma emanação de D’us como dizem outros. O Eterno é ruach!

Que possamos buscar a cada dia a compreensão verdadeira das Escrituras, e aplicá-la em nossa vida diária. Que o mover do Eterno haja em nossas vidas para que sejamos sempre direcionados para a obediência e prática da Torá.


Que o Eterno os abençoe e até o próximo estudo!


Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)


Bibliografia:

- Torá – Lei de Moisés. Editora Sefer

- Bíblia Judaica Completa de David H. Stern

- Nos Caminhos da Eternidade, Rabino Isaac Dichi

- https://www.yeshuamelekh.com.br/o_conceito_tanaico_de_espirito