Estudos da Torá
Parashá nº 22 – Vayakhel (Ele reuniu)
Shemot/Êxodo 35:1-38:20
Haftará (separação) 1Rs 7:40-50 e
B’rit Hadashah (nova aliança) 2Co 9:1-15; Hb 9:1-14.
Tema: Nem toda oferta é aceita
Imagine que você está construindo algo muito especial – um lar para alguém que ama profundamente. Você convida várias pessoas para ajudar, mas percebe que alguns não estão realmente comprometidos. Alguns trazem materiais de qualquer jeito, sem preocupação com a qualidade. Outros até contribuem, mas, ao mesmo tempo, minam a obra, falando mal do projeto ou duvidando de sua importância. O que você faria? Aceitaria qualquer ajuda ou escolheria apenas aqueles que realmente compartilham da sua visão e valores?
Essa é exatamente a situação que encontramos na Parashá Vayakhel. Antes do pecado do bezerro de ouro, o Eterno pediu ofertas para a construção do Mishkan a todos no meio de Yisrael. Mas depois do pecado, Ele restringiu esse chamado apenas aos filhos de Yisrael, excluindo aqueles cuja lealdade não estava confirmada. Mas por quê? O que isso nos ensina sobre servir ao Eterno?
Hoje, vamos mergulhar nesse tema e descobrir verdades profundas sobre compromisso, purificação e restauração messiânica. Afinal, será que o Eterno aceita qualquer serviço? Será que estar entre o povo de Yisrael significa, automaticamente, estar qualificado para participar da Sua obra?
Se essas perguntas despertam sua curiosidade, continue até o fim, porque há algo muito importante para aprender!
RESUMO DA PARASHÁ DA SEMANA
A Parashá Vayakhel nos apresenta Moshé reunindo o povo de Yisrael para transmitir as instruções do Eterno sobre a construção do Mishkan (Tabernáculo). Logo no início, Moshê relembra a importância do Shabat, destacando que nem mesmo a obra sagrada do Mishkan deveria ultrapassar o mandamento de descansar no sétimo dia. Isso ensina que, por mais grandioso que seja um projeto, nada deve se sobrepor à ordem do Eterno.
O povo de Yisrael trouxe ofertas voluntárias para a construção do Mishkan, desde ouro, prata e tecidos até habilidades e talentos artísticos. O texto enfatiza que os corações das pessoas foram movidos pela vontade de contribuir. Esse detalhe destaca a importância da generosidade e da participação ativa na obra do Eterno.
Dois artesãos foram escolhidos para supervisionar a obra: Betsalel, da tribo de Yehudá, e Oholiav, da tribo de Dan. O Eterno lhes concedeu sabedoria e habilidade para conduzir os trabalhos. Isso nos ensina que os talentos vêm do Eterno e devem ser usados para propósitos elevados.
Um momento surpreendente ocorre quando Moshé precisa dizer ao povo para parar de trazer doações, pois já havia material suficiente para a obra. Esse episódio ressalta a abundância que surge quando as pessoas contribuem de coração.
A Parashá descreve a confecção do Mishkan e de seus utensílios, incluindo a Aron HaBrit (Arca da Aliança), o Menorá (candelabro de ouro), o Mizbeach (altar) e as cortinas detalhadas do Tabernáculo. Cada elemento tem um simbolismo profundo, apontando para a santidade e a presença do Eterno no meio do povo. A Parashá Vayakhel nos ensina que a verdadeira construção não é apenas física, mas espiritual, baseada na obediência e no desejo sincero de viver segundo os mandamentos do Eterno.
ESTUDO DO TEXTO DA PARASHÁ
וַיַּקְהֵ֣ל מֹשֶׁ֗ה אֶֽת־כָּל־עֲדַ֛ת בְּנֵ֥י יִשְׂרָאֵ֖ל וַיֹּ֣אמֶר אֲלֵהֶ֑ם ֚אֵלֶּה הַדְּבָרִ֔ים אֲשֶׁר־צִוָּ֥ה יְהוָ֖ה לַעֲשֹׂ֥ת אֹתָֽם
vayakhel mosheh et-kal-adat bney yisrael vayomer alehem eleh hadevarym asher-tsivah HaShem laasot otam.
Mosheh reuniu toda a comunidade dos filhos de Yisrael e lhes disse: Isto é o que o Eterno ordenou fazer. Ex 35:1
Ao estudarmos essa parashá, nós podemos perceber que há uma mudança de linguagem do Eterno em relação aos pedidos de doação para o Mishkan antes e depois do pecado do bezerro de ouro, isso é algo profundo e muito significativo. Se você for uma pessoa observadora percebeu que eu sublinhei os termos “filhos de Yisrael”, isso está intimamente ligado com nosso assunto. Apesar de algumas traduções apresentarem outros termos neste trecho, o hebraico, como pode ser visto, traz exatamente o que marquei. Vejamos então a diferença entre os dois momentos:
- Antes do pecado, em Shemot 25:2, o Eterno ordena: Fala aos filhos de Yisrael que me tragam uma oferta; de todo homem cujo coração o mover voluntariamente, tomareis a minha oferta.
Aqui, o convite é universal dentro do acampamento, aceitando a doação de qualquer pessoa motivada de coração.
- Depois do pecado, em Shemot 35:1 e 4-5, a instrução muda: Mosheh reuniu toda a comunidade dos filhos de Yisrael e lhes disse: Isto é o que o Eterno ordenou fazer. Isto é o que o Eterno ordenou: Tomai do que tendes uma oferta para o Eterno; cada um de coração generoso a trará: ouro, prata e bronze...
Agora, o chamado é dirigido especificamente aos filhos de Yisrael, sem mencionar aqueles que estavam no meio do povo, como a erev rav (multidão mista que saiu do Egito com Yisrael). Mas como podemos entender isso, e de onde se tira tal conclusão? Como sempre, observando o texto em um nível mais profundo que o meramente superficial ou literal. Observando os textos em hebraico e os contextos culturais judaicos.
A mudança na ordem divina sobre quem poderia contribuir para a construção do Mishkan (Tabernáculo) após o pecado do bezerro de ouro revela princípios profundos sobre o relacionamento do Eterno com Seu povo. Como vimos acima, antes do pecado, a doação voluntária era aberta a todos os que saíram do Egito, incluindo o “erev rav”, os representantes de 70 nações que saíram com os hebreus; depois do pecado, apenas os filhos de Yisrael foram chamados a participar da doação. Essa mudança não foi apenas um detalhe administrativo, mas uma lição espiritual e profética de grande impacto. Para compreendermos essa transição, exploraremos três aspectos essenciais: a necessidade de um compromisso genuíno; o princípio da purificação após o erro e a conexão entre essa seleção e a restauração através do messias.
Antes de continuar nosso estudo vamos observar o que Bruno Summa, em um de seus comentários dessa parashá no livro Sha’arei Torah – Portões da Torah – Shemot 5, diz sobre este fato intrigante nessa porção.
Ele diz que o nome dessa parashá é divido à maneira única como Moshê se dirige à congregação de Yisrael utilizando o termo “Vayakhel” - וַיַּקְהֵ֣ל - “e convocou”, fazendo uma abordagem que ainda não se tinha visto e que também não se voltaria a ver em toda a Torah. Segundo o autor, todas as vezes que Moshê se dirigia aos “filhos de Yisrael”, a Torah utiliza expressões dos verbos “le’emor – dizer e “ledaber” – falar. Então como normalmente se faz ao estudar a Torah, quando se vê alga que chame a atenção, busca-se mais sobre aquilo. Assim, o autor se pergunta, por que justamente no início dessa parashá, aquela que por vias de fato fala sobre a construção do Mishkan, o símbolo do perdão pelo pecado do bezerro de ouro, Moshê aborda Yisrael através de “Vayakhel”, uma convocação de todo o povo? E no livro o autor faz toda um comentário e apresenta um comentário de Rashi sobre o fato de verdadeiramente não ter sido Moshê quem convocou o povo. No entanto, mais à frente nesse comentário, o autor vai começar a falar sobre a mencionada alteração da ordem do Eterno para os doadores. Ele começa afirmando que a Torah se dá ao trabalho de repetir os detalhes sobre o Mishkan. E que para muitos, as duas últimas parashot são desnecessárias e aparentemente não possuem nada de novo que não havia ainda sido dito. Porém, há um minúsculo detalhe logo no primeiro versículo que serve para mudar completamente a forma como a repetição sobre a construção do Mishkan deve ser compreendida.
Segundo o autor, o capítulo 35 repete a doação que HaShem já havia ordenado anteriormente para a construção do Mishkan, mas se compararmos ambos os momentos, aquele que ocorreu antes do pecado do bezerro de ouro com aquele que ocorreu após o pecado, veremos que há um detalhe que diferencia ambas as situações profundamente. O autor mostra os versos que já citamos acima, e explica que enquanto no capítulo 25, quando o Eterno fala sobre a doação que o povo deveria levar para a construção do Mishkan, Ele diz que a doação deveria ser feita por “kol ish” – todo homem, no entanto, no capítulo 35, após o pecado do bezerro de ouro, o Eterno diz que a doação deveria ser feita pelos “bnei Yisrael” – filhos de Yisrael. Isso é, antes do pecado, HaShem estava aceitando a doação de todo homem, Yisrael e erev rav, porém após o pecado, HaShem apenas aceitaria doações de Yisrael e não mais de estrangeiros. Estes foram os que levaram Yisrael a transgredir e cometer idolatria, por isso, agora o Eterno mudou sua forma de agir e estabelece uma divisão profunda por trás do mandamento da Tzedakah. A idolatria associada às nações do mundo, mesmo aquela entre aqueles que servem a HaShem por outros meios que não seja pela Torah, impurifica a alma humana e o torna como um membro do erev rav. E, o autor continua, como membro desse grupo, sua doação se distingue da doação que HaShem demandou a Yisrael, uma distinção vista na forma como HaShem retribui quem faz a doação. Ou seja, a Torah está dizendo que a Tzedakah é um ótimo mandamento para que um homem saiba em que lado ele está, se ele é Yisrael ou se ele é erev rav. Com tudo isso, percebemos que o Eterno olha para a kavanah, a intenção do coração do homem. Ele vê quem realmente deseja servi-lo e quem está ligado à idolatria. E se HaShem sabe quem são os fiéis, Ele os chama a um compromisso, vejamos então como se dá o chamado.
1. O Chamado para um Compromisso Genuíno
No primeiro chamado para as ofertas, em Shemot 25:2, o Eterno diz: Fala aos filhos de Yisrael que me tragam uma oferta; de todo homem cujo coração o mover voluntariamente, tomareis a minha oferta.
Esse convite aberto refletia a fase inicial da jornada de Yisrael, onde ainda havia uma inclusão ampla de todos que estavam no meio do povo, incluindo a erev rav (multidão mista) que saiu do Egito junto com eles. O Eterno queria que todos tivessem a chance de se aproximar e participar da construção do lugar de Sua presença.
Porém, o pecado do bezerro de ouro demonstrou que nem todos no meio do povo estavam verdadeiramente comprometidos com Ele. Muitos ainda carregavam influências da idolatria egípcia, e isso ficou claro quando o povo, pressionado pela erev rav, construiu o ídolo. Você pode se perguntar: Mas o Eterno não sabia que o erev rav faria o povo transgredir? Sim, sabia. Porém, era preciso mostrar na pratica que aqueles que não tem um coração voltado ao Eterno, não permanece no meio do seu povo, por mais que desejem.
Após esse episódio, a ordem muda em Shemot 35, onde Moshê se dirige apenas aos filhos de Yisrael, excluindo aqueles cuja lealdade ao Eterno era questionável. Isso nos ensina que o serviço ao Eterno não pode ser feito por aqueles que ainda não decidiram abandonar a idolatria e a rebeldia. E também comprova que nem todos que dizem querer servir ao Eterno, realmente vá servir.
Esse princípio é ecoado pelos profetas, como em Yirmiyahu/Jeremias 7:9-10, onde o Eterno repreende os que tentam servi-lo sem um coração puro: Roubareis, matareis, e adulterareis, e jurareis falsamente, queimareis incenso a Baal, e andareis após outros deuses que não conhecestes, e então vireis e vos apresentareis diante de Mim, nesta casa que se chama pelo Meu nome, e direis: Estamos salvos! – apenas para continuardes a cometer todas essas abominações?
O Eterno exige um compromisso genuíno, não apenas palavras ou rituais vazios. Ele chama os de coração íntegro para firmarem um verdadeiro compromisso de seguir suas palavras por amor e dedicação.
2. O Princípio da Purificação Após o Erro.
O pecado do bezerro de ouro exigiu uma purificação no meio do povo. Moshê deixa claro que a separação entre os que estavam verdadeiramente ao lado do Eterno e os que permaneceram rebeldes era necessária. Em Shemot 32:26, ele faz um chamado decisivo:
Quem é por HaShem, venha até mim!
Essa mesma separação pode ser vista nos ensinamentos de Yeshua. Em Matityahu (Mateus) 7:21-23, ele alerta que não basta dizer "Senhor, Senhor", mas é preciso fazer a vontade do Pai: Nem todo aquele que Me diz: 'Senhor, Senhor' entrará no Reino dos Céus, mas aquele que faz a vontade de Meu Pai que está nos Céus. Muitos Me dirão naquele dia: 'Senhor, Senhor, não profetizamos em Teu nome, e em Teu nome não expulsamos demônios, e em Teu nome não fizemos muitos milagres?' Então lhes direi claramente: Nunca vos conheci. Afastai-vos de Mim, vós que praticais a iniquidade!
Fazer a vontade do pai é cumprir Torah, obedecer aos seus mandamentos, viver segundo o caminho que ele preparou. A purificação após o erro não é apenas um conceito do TaNaK, mas uma verdade espiritual contínua. O Eterno sempre dá a oportunidade de retificação, mas exige ação concreta e mudança de coração.
O mesmo princípio é reforçado em Ma’assei HaShlichim (Atos dos Emissários) 3:19, onde Kefa exorta o povo: Arrependei-vos, pois, e convertei-vos, para que sejam apagados os vossos pecados, e venham tempos de refrigério da presença do Eterno.
Ou seja, não basta estar entre o povo – é preciso estar purificado e comprometido para realmente fazer parte da obra do Eterno. As doações para a obra, ou seja, seu tempo, dedicação, e vida, precisam ser de alguém que verdadeiramente esteja purificado, fazendo teshuvah. Isso é o apontamento para o futuro, quando o messias retornará e implantará o Reino do Eterno restaurando todas as coisas para o Eterno, e os purificados farão parte dele.
3. O Mishkan e a Restauração Messiânica
O Mishkan não era apenas um local físico, mas um símbolo da presença do Eterno entre o Seu povo, já estudamos sobre isso. Em Shemot 25:8, Ele declara: E Me farão um santuário, e habitarei no meio deles.
Isso aponta proféticamente para a restauração messiânica, onde o propósito final do Eterno é habitar novamente entre o Seu povo, ou seja, dentro de cada indivíduo.
A exclusividade da doação para a construção do Mishkan após o pecado do bezerro de ouro tem um paralelo direto com a forma como o Reino do Eterno será estabelecido nos tempos do Mashiach. Em Yechezkel (Ezequiel) 44:9, o profeta fala sobre a entrada no Santuário futuro: Assim diz HaShem: Nenhum estrangeiro, incircunciso de coração e incircunciso de carne, entrará no Meu santuário, de todos os estrangeiros que estão no meio dos filhos de Yisrael.
Isso significa que a restauração final não será para aqueles que desejarem estar presentes, mas sem terem tido compromisso com HaShem, mas para aqueles que realmente têm um coração circuncidado, ou seja, um compromisso verdadeiro com o Eterno.
Shaul (Paulo), em Romanos 2:29, reforça esse conceito ao dizer: O verdadeiro judeu é aquele que o é no interior, e a verdadeira circuncisão é a do coração, no espírito, e não na letra; o louvor desse não vem dos homens, mas do Eterno.
Assim como no Mishkan, onde apenas os filhos de Yisrael os fiéis puderam participar da construção, no Reino do Mashiach é a mesma coisa, apenas os que realmente servem ao Eterno, cumprindo sua Torah, em verdade e retidão, terão parte na restauração final.
Concluindo nosso estudo, a mudança na ordem divina para as doações da construção do Mishkan nos ensina uma verdade poderosa: o Eterno oferece oportunidades a todos, mas após a manifestação da idolatria e da rebeldia, apenas aqueles que realmente desejam segui-lo permanecem.
O compromisso com o Eterno precisa ser verdadeiro e ativo – palavras vazias não bastam.
A purificação após o erro é essencial – não podemos misturar santidade com impureza.
O Mishkan era um reflexo da presença do Eterno, e assim será no Reino Messiânico – somente aqueles que têm um coração circuncidado farão parte dele.
Assim como Moshê fez o chamado: Quem é por HaShem, venha até mim!, hoje cada pessoa precisa escolher se realmente quer estar na obra do Eterno ou apenas entre o povo de forma superficial. A prática é mais importante que a aparência.
Que possamos sempre buscar essa verdadeira conexão com o Eterno, com um coração puro e uma vida de obediência!
Que o Eterno os abençoe e até o próximo estudo!
Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)
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