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quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Estudo da Parashá Yitro - Precisamos de um mediador?


 Estudos da Torá

Parashá nº 17 – Yitro (Jetro)

Shemot/Êxodo 18:1 – 120:26

Haftará (separação) Is 6:1 – 7:6; 9:5-7 e

B’rit Hadashah (nova aliança) Mt 5:21-30; 15:1-11; 19:16-30.


Tema: Precisamos de um mediador?


Desde os tempos antigos, a relação entre o Eterno e a humanidade tem sido marcada por momentos de proximidade e temor. No Monte Sinai, ao testemunhar a grandiosidade da revelação divina, Bnei Yisrael se viu incapaz de suportar tamanha santidade e clamou por um mediador, pedindo que Moshê falasse em seu lugar. Esse episódio levanta um questionamento fundamental: a mediação entre o Eterno e os homens é realmente necessária ou é uma demonstração da fragilidade humana?

Ao longo da história, diferentes figuras exerceram papéis de intercessores – desde Moshê, que transmitiu a Toráh ao povo, passando por Kohen Gadol, que realizou expiações no Beit HaMikdash, até a figura do Mashiach, esperado como aquele que guiará Yisrael no retorno à Toráh. Mas essas funções indicarão uma separação essencial entre o Eterno e os homens? Ou foram apenas instrumentos para ensinar e fortalecer a conexão individual com o Criador?

Neste estudo, exploraremos as perspectivas das Escrituras, do Midrash e do Talmud sobre a função do mediador, analisando o papel de Moshê, dos sacerdotes e do Mashiach à luz do propósito original do Eterno: um relacionamento direto e íntimo com Seu povo.


RESUMO DA PARASHÁ DA SEMANA

Na Parashá Yitro encontramos a entrega das Aseret HaDibrot (Dez Declarações), conhecidas como “os dez mandamentos”, que representam o coração dos princípios do Eterno para o seu povo. Mas antes disso, há um encontro significativo entre Moshê e seu sogro, Yitro.

Yitro, sacerdote de Midiã e sogro de Moshê, ouve sobre as maravilhas que o Eterno fez ao libertar Bnei Yisrael do Egito e decidiu ir ao encontro deles no deserto, levando com ele Tziporah (esposa de Moshê) e seus filhos. Ao chegar, ele observa como Moshê o dia inteiro julgando o povo e aconselha que ele delegue essa tarefa, nomeando líderes para ajudá-lo a resolver os casos mais simples, deixando apenas os mais difíceis para ele. Isso mostra a importância de compartilhar responsabilidades e de uma boa organização dentro de uma comunidade.

Bnei Yisrael chega ao deserto do Sinai e acampa diante da montanha. O Eterno chama Moshê ao topo do monte e dá uma mensagem para o povo:

Agora, se ouvirdes atentamente a Minha voz e guardardes a Minha aliança, sereis para Mim um tesouro especial dentre todos os povos, pois toda a terra é Minha. Shemot 19:5


Moshê transmite as palavras do Eterno, e o povo responde unânime:


Tudo o que o Eterno falou, faremos! Shemot 19:8


O Eterno então ordena que o povo se santifique por três dias, pois Ele Se revelaria sobre a montanha. O Monte Sinai fica envolto em nuvens, trovões e fogo, e o som do shofar ressoa fortemente. O povo treme diante da grandiosidade dessa manifestação.

O momento culminante ocorre quando o Eterno se pronuncia como Aseret HaDibrot. Estas palavras divinas estabelecem os princípios essenciais da relação do homem com o Eterno e com seu próximo:

    1. Reconhecer o Eterno como único Elohim.

    2. Não fazer imagens para servirem como se fossem D’us.

    3. Não tome o Nome do Eterno em vão.

    4. Guardar o Shabat como um dia santo.

    5. Honrar pai e mãe.

    6. Não matar.

    7. Não cometer adultério.

    8. Não roube.

    9. Não dar falso testemunho.

    10. Não cobiçar o que pertence ao próximo.

A experiência no Sinai é tão intensa que o povo, temendo, pede para que Moshê fale em vez do próprio Eterno. Moshê os tranquiliza, dizendo que essa manifestação veio para que o temor do Eterno estivesse sempre diante deles, para que não pecassem.

A Parashá Yitro nos ensina sobre liderança, humildade e compromisso com o Eterno. Yitro nos mostra que um líder de valor sabe ouvir conselhos e compartilhar responsabilidades. O povo, ao receber os princípios, demonstra a sua disposição em obedecer ao Eterno, um compromisso que continua até hoje.

Que estejamos sempre prontos a dizer: "Naasê VeNishmá""Faremos e ouviremos", confiando que os caminhos do Eterno são justos e perfeitos.


ESTUDO DO TEXTO DA PARASHÁ

A Parashá Yitro apresenta um momento sublime e impressionante da história de Bnei Yisrael: a revelação do Eterno no Monte Sinai. A intensidade da manifestação divina foi tão avassaladora que o povo, tomado por uma mistura apavoro e de temor, pediu a Moshê que falasse com o Eterno em seu lugar e lhes trouxesse a mensagem de HaShem, se tornando o mediador. Esse episódio levanta uma questão fundamental: a necessidade de um mediador entre o Eterno e os homens. Mas será que essa mediação é uma exigência do Eterno ou uma fraqueza humana? E como essa função se manifesta ao longo da história de Yisrael? E pode o homem deixar de necessitar de um mediador?

Os rabinos e os midrashim abordam a ideia de um mediador entre o Eterno e os homens de diferentes formas, mas a visão predominante na tradição judaica é que o Eterno deseja um relacionamento direto com Seu povo. Qualquer mediação que tenha existido foi mais por uma necessidade humana do que por um decreto divino absoluto.


1. Moshê: O primeiro Grande Mediador

Ao ouvirem a voz do Eterno, acompanhada por trovões, relâmpagos e o som ensurdecedor do shofar, Bnei Yisrael se apavorou, temendo não sobreviver à santidade divina:


E disseram a Moshê: Fala tu conosco, e ouviremos; mas que o Eterno não fale conosco, para que não morramos. Shemot 20:16


O próprio Moshê responde, encorajando-os:


Moshê disse ao povo: Não temais, pois o Eterno veio para vos provar, e para que o Seu temor esteja diante de vós, para que não pequeis. Shemot 20:17


Aqui, vemos que o povo vê suas limitações diante da presença do Eterno. Moshê como líder e libertador, agora assume a posição de mediador, conduzindo as palavras do povo ao Eterno e transmitindo Suas instruções ao povo, preparando-os para obedecerem a aliança e entrar na terra. Esse papel se intensifica ao longo do deserto, quando Moshê intercede pelo povo em momentos críticos, como no episódio do bezerro de ouro, que podemos ler em Shemot 32.

A mediação de Moshê não se dá por um decreto divino, mas pela incapacidade humana do povo de lidar diretamente com a santidade absoluta do Eterno. Ele se tornou um instrumento para facilitar essa conexão, como canal de comunicação entre o Eterno e Yisrael.

É o mesmo que acontece conosco! Ao nascermos precisamos de cuidadores pois não podemos ter acesso ao mundo sozinhos, devido sermos muito pequenos. Depois precisamos de professores para nos ensinar a lidar com as questões desse mundo. E aí ficamos mais velhos e temos mediadores que nos ajudam depois de tudo que aprendemos a entrar no mundo e começar nossa vida sozinhos. São nossos pais, professores das escolas, das faculdades, etc, até termos maturidade para começar a caminhar só tomando nossas próprias decisões.

A revelação do Eterno no Monte Sinai deixou o povo de Yisrael apavorado. O Midrash comenta que a intensidade da experiência foi tão forte que, segundo alguns rabinos, cada palavra dita pelo Eterno faz com que suas almas deixem seus corpos. Por isso, o povo implora para que Moshê fale em seu lugar.

O Midrash Tanchuma (Parashá Yitro 11) explica que, antes do evento do Sinai, o Eterno conversou diretamente com os patriarcas. No entanto, devido ao temor do povo, Moshê passou a intermediar essa comunicação. O Midrash sugere que esse pedido declarou uma fraqueza espiritual do povo, pois o ideal sempre foi que Yisrael tivesse uma conexão direta com o Eterno.


2. O Sumo Sacerdote: A Mediação Através do Serviço no Mishkan

Mais tarde com a construção do Mishkan (Tabernáculo), e a separação dos levitas como sacerdotes e Aharon como Sumo Sacerdote, o Eterno estabelece um sistema mais estruturado para a mediação entre Ele e o povo. O Sumo Sacerdote (Kohen Gadol) passa a exercer um papel essencial, sendo o único que poderia entrar no Kodesh HaKodashim (Santo dos Santos) uma vez por ano, em Yom Kipur, para expiação dos pecados da nação, conforme Vayicrá 16. No entanto, os rabinos deixam claro que essa função não significa que o povo estava distante do Eterno. Na verdade a condição do homem era que às vezes atrapalhava o relacionamento, devido às desobediências.

Diferentemente de Moshê, cujo papel era de liderança e intercessão, o sumo sacerdote atuava principalmente no serviço do Mishkan, oferecendo sacrifícios e realização de rituais de purificação. Ele simbolizava a ponte entre o Eterno e o povo, garantindo que a conexão não fosse rompida pelo pecado e pela impureza.

Esse sistema reforçava a ideia de que a relação com o Eterno podia se dar por um representante, pois a santidade divina era inacessível ao homem comum. No entanto, os próprios profetas ensinaram que o Eterno deseja uma relação direta com Seu povo, baseada na obediência e pureza de coração, e não apenas em rituais, conforme podemos ler em Yirmiyahu 31:33 e Hoshea 6:6.

O Midrash Rabá (Vayicrá 1:7) comenta que o serviço do Kohen Gadol em Yom Kipur simbolizava a expiação coletiva, mas um teshuváh (arrependimento) individual continuava sendo responsabilidade de cada um. Ou seja, ele representava o povo, mas não substituía sua conexão direta com o Eterno. No Talmud Bavli, há uma discussão sobre se Yom Kipur expia os pecados por si só. A conclusão é que o arrependimento sincero é essencial, e que mesmo o sacrifício de Kohen Gadol não teria efeito se o coração do povo não estivesse voltado para o Eterno.

Isso reforça a ideia de que o papel do sacerdote não era de intermediário absoluto, mas sim de alguém que conduzia rituais para facilitar a purificação espiritual da nação, ou seja, o retorno ao estado de contato com o Eterno.


3. Yeshua como Mashiach: O Mediador da Aliança Renovada

Contudo, havia uma profecia sobre o messias, que faria esse papel de mediador, a fim de facilitar o acesso das pessoas ao Eterno. Isso seria feito através do ensino da Torah limpa. Yeshua surgiu em um momento em que o Beit HaMikdash ainda estava de pé, e o sistema sacerdotal continuava em funcionamento. No entanto, ele assume um papel único, declarando a teshuváh (retorno ao Eterno) e chamando o povo à obediência sincera aos preceitos de HaShem.

Ele não se coloca no lugar de Moshê ou do sumo sacerdote, mas cumpre a função de mediador de uma nova etapa no relacionamento do Eterno com Yisrael. Sua missão não era substituir a conexão direta com o Eterno, mas reafirmá-la, como ele mesmo ensinou:

Ninguém vem ao Pai senão por mim. Yochanan/Jo 14:6


Isso não significa que Yeshua bloqueie o acesso ao Eterno, mas sim que ele é o instrumento pelo qual a aliança é renovada e os homens são direcionados ao arrependimento e à aprovação. Yeshua é a porta de acesso ao Eterno.


Eu sou a porta; quem entra por mim será salvo. Entrará e sairá, e encontrará pastagem. Yochanan/Jo 10:9


Assim como Moshê ensinou os mandamentos e o sumo sacerdote intercedeu no Templo, Yeshua atua chamando os homens à reconciliação com o Eterno, sem negar a responsabilidade individual de cada um diante do Criador. Ele não anula o modelo estabelecido no TaNaK, mas o aprofunda, ensinando que a verdadeira mediação não é apenas ritualística, mas sim transformadora, exigindo mudança de vida e compromisso real com o Eterno.

A tradição rabínica ensina que o Mashiach será um grande líder e professor que ajudará a restaurar Yisrael e trazer conhecimento do Eterno ao mundo. No entanto, ele não será um mediador entre o Eterno e os homens no sentido absoluto, como algumas tradições não-hebraicas ensinam, ou seja, o sistema cristão, que ensina que JC é o mediador absoluto. Diante do ensino de toda a Escritura, isso é uma enorme falácia.

O Rambam (Maimônides), em Hilchot Melachim 11:4, afirma que o Mashiach será um rei e trará benefícios semelhantes a Moshê, que trará Yisrael de volta à Toráh e estabelecerá a justiça, mas ele não substituirá a conexão do povo com o Eterno.

No Midrash, é dito que "o Mashiach orará pelo povo, assim como David fazia", mas isso não significa que ele será um intermediário, e sim um líder que incentivará cada indivíduo a se voltar ao Eterno pessoalmente.

O Talmud Bavli (Sanhedrin 98a) descreve o Mashiach como alguém que guiará Yisrael no caminho da Toráh e estabelecerá a paz, mas nunca como alguém que substituirá ou se colocará entre o povo e o Eterno permanentemente.

Com isso, fica muito claro que não devemos achar que precisamos de um mediador para chegar ao Eterno e manter um relacionamento com ele. O mediador age por nós durante um tempo, até que estejamos prontos para viver com o Eterno, da mesma forma que os patriarcas e o próprio messias viveram, em justiça.

Concluindo nosso estudo, podemos entender que a necessidade de um mediador surge da fragilidade humana diante da santidade do Eterno. Moshê exerceu esse papel porque o povo temia ouvir a voz divina diretamente. O sumo sacerdote foi criado com essa função no serviço do Mishkan, garantindo que a conexão com o Eterno fosse mantida para a nação. Yeshua, por sua vez, reforça o chamado ao relacionamento íntimo e individual com o Criador, ensinando que a verdadeira mediação se dá através da obediência, arrependimento e transformação de vida.

No entanto, desde o princípio, o desejo do Eterno sempre foi que Seu povo O buscasse diretamente, como está escrito:


E ser-me-eis um reino de sacerdotes e uma nação santa. Shemot 19:6


O conceito de um mediador absoluto entre o Eterno e os homens não é aceito na tradição judaica. A mediação que existe – seja por Moshê, pelos sacerdotes ou pelo Mashiach – sempre foi funcional e pedagógica, não um requisito essencial para se conectar ao Eterno. O objetivo da mediação nunca foi salvar o povo para o Eterno, mas sim conduzi-lo de volta a Ele, até que não haja mais barreiras entre nós e nosso Criador. E essa é a nossa missão: nos aproximarmos do Eterno através da obediência e do temor reverente, sem jamais terceirizar nossa responsabilidade de segui-lo.

O ideal sempre foi um relacionamento direto entre o Eterno e Yisrael, como está escrito:


Pois esta mitsvá que hoje te ordena não está oculto de ti, nem está distante. Não está nos céus, para que digas: Quem subirá por nós aos céus e no-la apresente? Nem está do outro lado do mar… Pois a palavra está muito perto de ti, na tua boca e no teu coração, para a cumprires." Devarim 30:11-14


O próprio TaNaK ensina que cada pessoa pode buscar e falar diretamente com o Eterno, sem a necessidade de um intermediário permanente. Os rabinos reforçam essa ideia, ensinando que a teshuváh, a obediência e a oração são as formas mais poderosas de se conectar com o Criador.

Assim, Moshê, os sacerdotes e o Mashiach não servem como barreiras entre nós e o Eterno, mas sim como guias que nos ajudam a fortalecer nossa própria conexão com Ele.


Que o Eterno os abençoe e até o próximo estudo!


Marcelo Santos da Silva (Marcelo Peregrino Silva – Moshê Ben Yosef)


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